José Maria Neves: "As crises que vivemos podem ser uma oportunidade para África"
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O presidente cabo-verdiano, José Maria Neves, discursou esta segunda-feira, 24 de Outubro, na cerimónia de abertura da 8ª edição do Fórum Internacional de Dacar sobre Paz e Segurança em África. O chefe de Estado cabo-verdiano lembrou que as crises que o mundo vive "podem ser uma oportunidade para África".
RFI: A África lusófona é convidada de honra nesta 8ª edição do Fórum Internacional de Dacar. Por que motivo?
José Maria Neves: Para nós, Cabo Verde, enquanto pequeno Estado insular em desenvolvimento, a presença aqui é estratégica. Não temos problemas de instabilidade. Cabo Verde sempre foi um país muito estável e um país que se tem afirmado, se tem desenvolvido e hoje é um país de rendimento médio. É um país onde as instituições funcionam e de boa governação. De todo modo, nós somos um participante activo no processo da construção da paz e da estabilidade a nível do continente africano. Queremos um continente de paz e de estabilidade para poder desenvolver-se e resolver os principais problemas que existem no continente.
Aquando da abertura deste fórum, no seu discurso, disse querer devolver o sorriso a todos os africanos e africanas. Qual é o desafio de Cabo Verde?
Disse isso porque queremos representar uma outra África, um África positiva, uma África com ambição e que quer desenvolver-se para devolver o sorriso a todos os africanos. Nós pensamos que tendo em conta os recursos de África, as capacidades existentes na África, todos os talentos, a imensa diáspora do continente é possível mobilizar tudo isto e por ao serviço do desenvolvimento. Se tivermos uma África mais moderna, mais próspera, mais forte, mais inclusiva será possível ter mais paz e estabilidade, e consequentemente muito mais desenvolvimento.
Quais são as estratégias para conseguir esse fim, numa altura em que o mundo está a braços com vários conflitos armados, não só no continente africano, mas na Europa. Vivemos uma escassez de energia, de cereais. Cabo Verde já sente estes efeitos?
Já estamos a sentir, sim. Há um aumento muito grande da inflação, o custo de vida está a aumentar. A pandemia trouxe mais pobreza, muito mais desigualdades, mais desemprego e veio a guerra na Ucrânia, com todos os seus impactos económicos, particularmente, a nível da inflação. Nós importamos cerca de 80% de cereais e também a nível da energia. O que eu acho é que esta crise pode ser uma grande oportunidade para África.
Em que sentido?
África não pode continuar a ser um muro de lamentações ou um continente marginal. Temos de aproveitar para fazer investimentos que são necessários para revolucionar a agricultura, por exemplo, para revolucionar a pecuária e a indústria agro-alimentar no continente africano. Para fazer a transição energética porque há enormes capacidades para produção de energia eólica e solar, para produção de hidrogénios verde. Há enormes possibilidades hidráulicas para produção de energia e temos de aproveitar desta crise para fazer a transição digital e para industrializar o continente, para infra-estruturar. Não podemos continuar como estamos. Há recurso e haverá, com certeza, desde que a África faça a mobilização de recursos financeiros que são necessários em África e fora do continente africano, estabelecendo as parcerias, ter agressividade suficiente para mobilizar todas as capacidades humanas na África e sua diáspora, para criar instituições económicas e políticas. O continente pode também dar o salto se tiver uma boa governança volta para resultados e para a dignidade da pessoa humana.
Sobre a política interna do país, a questão das ligações aéreas para as ilhas de Santo Antão e Brava, em que estado se encontra, uma vez que o senhor Presidente falou na possibilidade de se construir um aeroporto ou um porto?
Há dificuldades evidentes no plano nacional em relação aos transportes aéreos interilhas. O governo está a estudar o processo de construção do novo aeroporto em Santo Antão. Na Brava é mais difícil, mas estão a ser criadas as condições para melhorar todo o sistema dos transportes marítimos e aéreos.
A ilha da Brava tem um aeroporto, construído há muitos anos...
Sim, tem um aeroporto, mas não funciona por razões de segurança. A ilha Brava é servida somente com transportes marítimos.
Que olhar tem sobre o êxodos de mão de obra cabo-verdiana, nomeadamente, para o turismo algarvio?
A mobilidade de mão-de-obra é natura neste mundo de hoje, desde que seja uma mobilidade regulada e que não cause transtornos e graves constrangimentos ao funcionamento do tecido produtivo cabo-verdiano. O cabo-verdiano, desde sempre, andou pelos quatro cantos do mundo e vai continuar a andar. Pode fazer isso desde que queria procurar novas oportunidades, fazer novos voos e estamos a criar as condições internas para regular esse fluxo, de modo a não prejudicar a economia cabo-verdiana.
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