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Para analista, segundo mandato de Sarkozy seria mais conservador

O cientista político Jean-Yves Camus, especialista em extrema-direita e populismo no Instituto das Relações Internacionais e Estratégicas (Iris), de Paris, sustenta que um eventual segundo mandato do presidente francês, Nicolas Sarkozy, deve ser marcado por posições ainda mais à direita do que o primeiro governo. Mas não é certo, diz Camus, que o apoio do partido Frente Nacional será suficiente para levá-lo à vitória nas eleições presidenciais.

Jean-Yves Camus é autor de obras sobre a extrema-direita na Europa.
Jean-Yves Camus é autor de obras sobre a extrema-direita na Europa. Divulgação Iris/ Paris
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Você acha que a tendência de Sarkozy em campanha vai ser virar bastante à direita para agradar também ao eleitorado da extrema-direita?

Jean-Yves Camus: A ideia de Nicolas Sarkozy é a de que, se ele tiver um segundo mandato, ele vai virar verdadeiramente à direita, o que na cabeça dele é legítimo. Ele está convencido de que a escolha do povo francês nas eleições será decidida sob as questões de valores. Na minha opinião, ele tirou de cena um pouco rápido demais o fato de que a principal preocupação dos franceses é de ordem econômica. Ele está persuadido que é sobre os valores franceses que ele vai fazer a diferença, e que a única forma de encarar a Frente Nacional e os partidos da extrema-direita é passear pelos campos das ideias extrema-direita, como ele mostrou na entrevista.

Você acha que os votos da extrema-direita poderão ser decisivos para uma reeleição de Sarkozy em um eventual segundo turno?                                                                                                                                               Camus: Isso é um pouco mais complicado. Primeiro, precisamos saber se Marine Le Pen vai conseguir formalizar a sua candidatura. Ela ainda não conseguiu o apoio necessário para apresentar a sua candidatura. Mas enquanto isso, Sarkozy disse claramente que um partido que tem cerca de 18% dos votos deve poder ter um candidato às eleições presidenciais. Em outras palavras, quer dizer que a direita vai fazer o que for preciso para que a Frente Nacional consiga se candidatar. E depois, se Le Pen realmente conseguir se candidatar graças a uma ajudinha que lhe será dada, isso não acontecerá sem contrapartida. Vamos ver que declarações ela fará entre os dois turnos e se ela vai aconselhar os seus eleitores a votarem em Sarkozy, o que lhe facilitaria, evidentemente, o trabalho de se reeleger.

O eleitor da extrema-direita votaria imediatamente em Sarkozy em um segundo turno contra o candidato socialista, François Hollande?
Camus: A migração dos votos do Frente Nacional para a direita não acontece a 100%. Ainda que estatísticas mostrem que 70% votam na direita e 30% votam na esquerda ou se abstém, a verdade é que há eleitores da extrema-direita que, aconteça o que acontecer, não votarão em Nicolas Sarkozy no segundo turno. Há também a questão das abstenções em geral, que vai ter um papel determinante de um lado ou outro, no primeiro como no segundo turno. Acho que há uma dinâmica que existe também à esquerda: François Hollande tem a sua reserva de votos importante no segundo turno. Ou seja, não tenho certeza de que a estratégia de Sarkozy de colocar a campanha ainda mais à direita seja a melhor maneira de o UMP [partido de Sarkozy] sair vitorioso.

Na eventualidade de um segundo mandato de Sarkozy, você acredita que esse segundo governo vai ser certamente mais conservador, mais à direita?
Camus: Se existir segundo mandato, eu acho que ele será realmente esse que Sarkozy anunciou em sua entrevista à Figaro Magazine, ou seja, bastante à direita, especialmente sobre alguns assuntos, como os de cotidiano, que lhe parecem ir ao encontro da opinião geral do público francês.

Então você pensa que foram declarações não foram apenas no âmbito da sua campanha, mas sim é isso que ele realmente quer aplicar na França?
Camus: Acho que é realmente o que ele quer fazer, porque a Frente Nacional continua forte e Nicolas Sarkozy e o UMP sabem que, para o futuro, com uma Frente Nacional mantendo essa média de 18-20% dos votos, o UMP continua em perigo. O objetivo continua sendo o de voltar à situação de 2007, quando Sarkozy conseguiu praticamente eliminar a Frente Nacional das eleições. Eu acho que essa estratégia não vai funcionar, mas seja como for, é isso que o motiva a dar esse tipo de declarações enquanto candidato e o que motivará provavelmente as declarações do presidente, se reeleito.

De tempos em tempos, os governos de direita adotam os imigrantes como os responsáveis pelos problemas na França. A que ponto a sociedade francesa é, no fundo, contraria à imigração? Temos a impressão de que, se as declarações de Sarkozy encontram tanto respaldo na sociedade, é porque no fundo os franceses dizem uma coisa, mas pensam outra em relação à imigração. O que você acha?
Camus: Eu acho que há, devido à historia particular do nosso país, uma tensão em relação a uma imigração em particular, não-europeia e originária do antigo império francês, ou seja, os muçulmanos. Quando o presidente diz que a França tem origens judeo-cristãs, que é preciso evitar a comida halal e os horários reservados para as mulheres nas piscinas, ele visa claramente os muçulmanos. Mas no conjunto de imigrantes, as atitudes dos franceses são mais atenuadas do que parece. Há cada vez mais franceses que pensam que os imigrantes contribuem para a melhora da economia nacional. Há incontestavelmente um multiculturalismo que se instalou na França e sobre o qual não há volta possível. Multiculturalismo não no sentido de que haveria uma série de comunidades que vivem isoladas em si, como nos Estados Unidos ou na Inglaterra, mas multiculturalismo no sentido que a estrutura da população francesa mudou consideravelmente nos últimos 20 ou 30 anos. Com a globalização e a abertura das fronteiras, de maneira natural os estrangeiros chegaram na França e vivem junto à população. Esses imigrantes se instalaram aqui e não vão retornar aos seus países. Esse é o ponto essencial que os eleitores da Frente Nacional não entendem: é impossível voltar atrás.
 

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