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Reforma da UA: Cabo Verde defende governação multinível

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O chefe de Estado de Cabo Verde participou nos trabalhos da 37a cimeira de chefes de Estado e de Governo da União Africana, em Addis Abeba, na Etiópia. Em entrevista à RFI, José Maria Neves falou da reforma da União Africana, defendendo um sistema de governação multinível em África.

José Maria Neves, chefe de Estado de Cabo Verde, durante os trabalhos da 37a cimeira de chefes de Estado e Governo da União Africana.
José Maria Neves, chefe de Estado de Cabo Verde, durante os trabalhos da 37a cimeira de chefes de Estado e Governo da União Africana. © Presidência de Cabo Verde
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RFI: Os conflitos e as questões de segurança no continente marcaram a agenda dos líderes africanos. Que recomendações saem desta cimeira?

José Maria Neves, chefe de Estado de Cabo Verde: Há nas diferentes regiões um esforço, com intervenção de mediadores, para resolver esses conflitos. O Presidente do Congo, Sassou Nguesso, está a trabalhar a questão da Líbia-acabou de apresentar um relatório-e há perspectivas de uma reconciliação nacional entre as duas partes em conflito.

No Corno de África há os problemas entre a Etiópia e a Somália, mas também há esforços para um diálogo. O próprio primeiro-ministro da Etiópia apresentou a sua disponibilidade para se encontrar com o Presidente da Somália, procurando compromissos e uma solução para os problemas existentes entre os dois países.

Neste sábado, o Presidente da Somália, Hassan Sheik Mohamud, acusou as forças de segurança etíopes de o terem impedido de entrar na sede da União Africana para assistir à cimeira. O primeiro-ministro etíope,  Abiy Ahmed Ali, relativizou a situação, reiterando que recebeu o chefe de Estado da Somália com honras de Estado. Este incidente pode afectar este diálogo?

Essas questões ficaram expressas numa reunião que decorreu à porta fechada, mas houve a disponibilidade do primeiro-ministro para se ultrapassar este incidente.

Em relação aos outros conflitos-que são mais complexos-temos o problema do corredor do Sahel, uma questão muito difícil. Aqui a situação exigirá uma posição comum para reforçar os mecanismos de estabilização ao nível de toda a região e através do combate dos grupos extremistas. Uma solução que permita manter a paz e a estabilidade naquela região.

Depois temos as rupturas constitucionais, só na África ocidental temos quatro- temos ainda o Sudão e o Gabão, na África Central-que vão exigir esforços mais consistentes para se encontrar uma solução, já que Burkina Faso, Nigel e Mali, manifestaram a intenção de sair da CEDEAO.

Tem-se apelado ao diálogo entre as partes. O que é que ficou decidido?

Eu acho que é a única solução. Não há outra alternativa. Temos de fazer um esforço para revalorizar estrategicamente a CEDEAO, eventualmente isto tem a ver com a reforma da União Africana.

O senhor tem defendido uma reforma da União Africana. Quais são as suas propostas?

Deve haver uma redistribuição do trabalho e estabelecer-se um sistema de governação multinível em África, com responsabilidades bem definidas, ao nível da União Africana, ao nível das organizações sub-regionais e dos Estados para se evitarem as sobreposições e as interpretações diferenciadas, relativamente aos problemas existentes. Claro que tudo isto deve ser feito semem estreita articulação com os Estados, as organizações sub-regionais e a União Africana.

As questões de segurança devem ficar com a União Africana e as organizações sub-regionais devem ocupar-se da integração económica, devendo a União Africana apelar a mediadores, a outros países para participar nos processos de negociação e na busca de soluções, entendimentos entre as diferentes partes.

No caso da crise política do Senegal. Deve ser a União Africana a pronunciar-se?

Deve ser a União Africana a acompanhar, até para se garantir mais distanciamento, relativamente aos problemas, mas empre com os apoios dos países da região.

Muitos países criticam a ambiguidade das organizações. Por exemplo, a postura em relação ao que se passa no Senegal e na Guiné Bissau. Como é que se explica esta ambiguidade?

Às vezes há a análise dos dados e a forma como as questões são colocadas. É claro que os níveis de exigência em relação aos países são diferentes, tendo em conta o percurso e as experiências de cada país.

Claro que a nível do conselho de Paz e Segurança da União africana haverá sempre mais distanciamento e imparcialidade na análise dos diferentes dossiês. Mas sempre com o apoio das organizações sub-regionais.

Considero que essas questões ligadas com a governação democrática, a prevenção dos conflitos, os programas de estabilização devem ficar na alçada da União Africana. Isto porque muitas vezes vão exigir mobilização de recursos, capacidades que devem ser conseguidas ao nível do continente africano.

Neste momento é preciso também considerar que a África já é membro do G20. A participação de África no G20 exige uma profunda adequação organizacional.

O presidente da Comissão da União Africana, Moussa Faki, disse que é preciso que a União Áfricana decida como se vai comportar no G20, mas muitas vezes, assistimos no seio desta organização a posições individuais....

É precisamente por isso que há a necessidade dessa divisão do trabalho. Saber o que se deve fazer ao nível dos Estados, das organizações sub-regionais e ao nível da União Africana. É a África que é membro do G20, não é nenhum país isoladamente. Alguns países africanos, por causa do crescimento económico, podem individualmente chegar ao G20 e aqui também se exigirá alguma articulação. Mas quem está no G20 é a União Africana.

No entanto, há toda a problemática da reforma das Nações Unidas e em que África pleiteia uma participação mais forte. Será a nível da União Africana, como um todo, que terá de participar no Conselho de Segurança? Então que haja um trabalho nesse sentido e não na dispersão de esforços por parte dos diferentes países. São essas questões que precisamos discutir na reforma da União Africana.

Angola apresentou a candidatura para a presidência rotativa da União Africana, em 2025. Cabo Verde vai apoiar esta candidatura?

Apoiamos e vemos com bons olhos. Angola é uma grande potência em África e tem uma experiência positiva na busca da paz, podendo dar um contributo importante no processo de pacificação em África, designadamente nos Grandes Lagos-onde está a desempenhar um papel muito importante.

 

Angola está num processo de modernização da sua economia e sociedade e essa liderança poderá ser uma referência muito positiva no continente africano.

Depois há um pilar importante que tem a ver com a reforma da União Africana. O Presidente do Quénia, William Ruto assume agora a liderança do processo de reforma, espero que haja um aceleramento e que, com a presidência de Angola, consigamos objectivos muito consistentes. 

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