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Em Cabo Delgado, os grupos terroristas optam por novas "estratégias"

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Em Cabo Delgado, Moçambique, têm-se registado, nas últimas semanas, novos ataques e movimentações de grupos armados, depois de um período de relativa estabilidade. As tropas regionais da SAMIM (missão da SADC), que lutam contra a insurgência armada nesta província, devem retirar-se progressivamente até Julho de 2024. Para o investigador João Feijó, há uma "estratégia de diminuição da violência" por parte dos grupos armados, com o objectivo de "ganhar a confiança das populações". 

Um soldado ruandês na cidade fr Mocímboa da Praia, província de Cabo Delgado, Moçambique, 27 de Setembro de 2022.
Um soldado ruandês na cidade fr Mocímboa da Praia, província de Cabo Delgado, Moçambique, 27 de Setembro de 2022. © AFP / CAMILLE LAFFONT
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Esta semana, um ambiente de agitação apoderou-se nomeadamente da aldeia de Mussomero, a cerca de seis quilómetros da sede distrital de Quissanga, no norte da província de Cabo Delgado.

Os habitantes relatam que grupos armados foram vistos numa escola primária, não tendo protagonizado qualquer ataque. Todavia, a situação provocou alguma agitação e levou mesmo algumas pessoas da aldeia a optarem por abandonar as suas casas, segundo relataram habitantes locais à agência Lusa. 

Em entrevista à RFI, o investigador João Feijó, do Observatório do Meio Rural (OMR), descreveu uma situação de segurança "destabilizada", com uma presença dos grupos armados mais difusa geograficamente, e uma "estratégia de diminuição da violência" para ganhar a confiança das populações. 

Durante as comemorações do Dia dos Heróis Moçambicanos, a 3 de Fevereiro, o Presidente Filipe Nyusi alertou para novas tentativas de recrutamento por parte dos terroristas e lançou um apelo específico aos jovens para "não aderirem ao recrutamento". 

Apesar de tudo isto, queremos apelar à nossa resiliência coletiva, com vista a suster as investidas dos terroristas. Aos jovens, apelamos para não aderirem ao recrutamento e a reportarem qualquer movimento estranho que possa condicionar a segurança das comunidades.

(Filipe Nyusi, 3 de Fevereiro 2024)

No entanto, este apelo permanecerá "vazio" se não for acompanhado de medidas concretas, segundo João Feijó. O estudioso explica que para que a luta contra os grupos terroristas seja efectiva, será necessário haver uma aposta a nível social, educacional e a nível de empregabilidade.  

O Estado não tem recursos para conseguir uma grande campanha de contra-insurgência, que melhore a vida das pessoas e que leve as populações locais a não aderirem a grupos violentos.

Se estes apelos não forem acompanhados de coisas palpáveis e de benefícios concretos, acabam por ser apelos vazios que não têm grande impacto de mudanças. 

Há reformas que deveriam ser feitas, como a diversificação da economia; investir nas actividades que geram mais empregos como a agricultura, a pesca e o comércio informal e que estão largamente esquecidas das políticas públicas.

(Investigador João Feijó)

Por outro lado, está prevista a retirada progressiva das tropas regionais da SAMIM (a missão da SADC que luta contra o terrorismo em Cabo Delgado), até Julho de 2024. 

O embaixador da Rússia em Maputo, Alexandre Surikov afirmou, à margem de um evento no Palácio da Ponta Vermelha, residência oficial do Presidente Filipe Nyusi, que "se Moçambique solicitar alguma coisa, poderá sempre contar com a Rússia".

O estudioso João Feijó, para quem a SAMIM "não teve um papel assim tão decisivo", esta retirada "não deixa de ser preocupante". Desde já, porque irá "retirar recursos militares no terreno", deixando as tropas moçambicanas mais vulneráveis". 

Eu enquadro o interesse russo dentro de um panorama de competição internaiconal pela aquisição de influência naquela zona e adquirir acesso a licenças de exploração de recursos naturais. 

A vinda de tropas estrangeiras vai depender sempre do acesso a recursos. As tropas estrangeiras virão se tiverem contrapartidas. 

Há muitos anos que grande parte da área de Cabo Delgado já tem interessados. Significa que a entrada de novos actores vai implicar uma competição com aqueles já estabelecidos. isso vai implicar reconfigurações de poder, que terão depois consequências no escalar do conflito. 

Este é um fenómeno bastante complexo e quanto mais se internacionaliza, pior se agrava. Até porque, quando mais se internacionalizam as tropas que vêm apoiar o Governo, maior é o risco de internacionalização que vêm apoiar o grupo rebelde.  

(Investigador João Feijó)

Ouça a entrevista na íntegra aqui: 

07:14

Investigador João Feijó 09.02.23

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