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Angola na Coreia do Sul para diversificar economia

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Terminou nesta terça-feira, 30 de Abril, a visita oficial de dois dias do Presidente de Angola à Coreia do Sul. Em Seul, João Lourenço foi recebido pelo homólogo sul coreano, Yoon Suk-yeol, e participou no Fórum Económico com vista ao reforço das relações bilaterais. Em entrevista à RFI, Sérgio Dundão, cientista político de Angola, fala das áreas de cooperação entre os dois países, sublinhado que Angola continua empenhada em diversificar os parceiros comerciais.

O chefe de Estado de Angola, João Lourenço, terminiu visita de dois dias à Coreia do Sul.
O chefe de Estado de Angola, João Lourenço, terminiu visita de dois dias à Coreia do Sul. © Presidência da República de Angola
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O que procura o Presidente João Lourenço com esta visita de Estado à Coreia do Sul?

O Presidente angolano, desde o primeiro mandato, tem procurado diversificar os países com os quais estabelece relações, para além daqueles países que já são tradicionais, como a Rússia, por questões históricas, e os Estados Unidos, pelo seu papel geo-geopolítico. O Presidente também tem procurado outros países que são hoje “players” importantes, não só ao nível da Europa, mas também na Ásia e querendo ou não, a Coreia do Sul é um país com grande potencial do ponto de vista da indústria.

Angola e a da Coreia do Sul assinaram quatro instrumentos jurídicos nas áreas do comércio, saúde, ordem pública e diplomacia. O que é que representam estes acordos jurídicos para o país?

Os países têm por tradição assinar esses documentos, do ponto de vista das relações, que criam aquilo que são instrumentos genéricos ou gerais, permitindo que os países afirmem as linhas de cooperação que pretendem estabelecer. Mas, mais importante do que isso, é perceber se isso vai se traduzir na prática. Ou seja, se esses instrumentos vão levar investimento sul coreano para Angola, numa altura em que o país precisa de investimento externo. Ou seja, precisamos de captar investimento directo estrangeiro para alavancarmos a economia angolana que se encontra  com algumas dificuldades, sobretudo na questão do desemprego.

Durante o Fórum Económico, em Seul, o Presidente de Angola disse que o país está a melhorar o ambiente de negócios e falou da lei de investimento privado vigente. Considera que esta lei tem facilitado o investimento estrangeiro? Ou ainda há muita burocracia que impede que os empresários de outros países possam vir investir em Angola?

A questão não é só a questão das leis. Trata-se da transparência e do combate à corrupção. A capacidade de o país apresentar um quadro de regulação do comércio, que os tribunais funcionem, dando garantia aos investidores e ao investimento. A lei é um instrumento, mas há outros aspectos que Angola tem de melhorar.

Sobretudo, quando se trata de países que têm regras ou cumprem regras, porque não operam apenas na geografia angolana, estão em outras geografias. E quando não cumprem esses pressupostos, são penalizados por outros Estados que, na questão do “compliance” e do branqueamento de capitais, são mais exigentes.

João Lourenço insistiu no facto de Angola ser uma economia aberta, um país com uma população jovem e com inúmeras potencialidades de negócio. Quais são as áreas de cooperação entre Angola e a Coreia do Sul?

A Coreia do Sul tem um grande conhecimento no sector do automóvel e com uma indústria pujante. No sector das telecomunicações, a Coreia do Sul tem um grande potencial. Além disso, no que refere à indústria farmacêutica, Angola tem grandes necessidades, devido aos investimentos que o Governo tem feito com a construção de hospitais. Depois há outros sectores que vão por arrasto. No domínio da agricultura, os países asiáticos têm muito interesse na questão do agronegócio e do agroalimentar.

O chefe de Estado que falou, nomeadamente,  na questão do arroz. O que pode a Coreia do Sul oferecer a Angola no domínio da agricultura?

A Coreia do Sul é um dos países do continente asiático mais desenvolvidos ao nível tecnológico e Angola precisa de captar investimento nessa área. A produção manual não vai permitir o crescimento da produção agrícola, o país precisa de um processo de transformação rápido para conseguir acabar com a fome. A questão da fome está associada também à produção e ao escoamento dos produtos.

O chefe de Estado de Angola pediu investimento nas infra-estruturas navais, no Corredor do Lobito, na produção de painéis solares. João Lourenço disse que Angola pode ser mesmo um player na questão da energia solar, podendo vir a exportar energia no futuro...

No meu entender, Angola tem uma vantagem competitiva nas questões da energia. Não só a energia solar, mas também na energia hidráulica, basta ver o investimento que está a ser feito nas refinarias, mas também na sua localização. Ao nível da SADC, Angola deve apostar estrategicamente no sector das energias, quer nas velhas formas de produção de energia ou no sector das energias renováveis. Nesse ponto de vista, o Presidente está alinhado com a estratégia que tem sido desenvolvida pelos ministros da Energia e Águas e dos Recursos Minerais, porque têm feito investimentos avultados nesses dois sectores.

No que diz respeito ao Corredor do Lobito, trata-se de um investimento que Angola espera rentabilizar. Acredita que Angola tem que ter uma visão estratégica para o Corredor do lobito, porque é uma infa-estrutura fundamental. Já foi no passado e espera-se que no futuro possa ser um elemento que vá alavancar a economia não só de Angola, mas dos países à volta ou da região da SADC.

E numa altura em que Angola quer diversificar a economia, há a eterna questão petrolífera. Que parcerias podem ser criadas com a Coreia do Sul neste sector?

Acima de tudo, por causa das refinarias, Angola vai precisar de um conhecimento tecnológico muito avançado, não só do ponto de vista da captação de investimento, mas também ao nível na formação de quadros. Esta formação vai permitir que os angolanos operem em sectores com um grau elevado de tecnologia, diversificação da economia pública e modernização.

Isto implica também capacidade técnica dos quadros angolanos porque, bem ou mal, serão os quadros angolanos a operar o processo de transformação da economia. Isto significa que os quadros angolanos têm que obter desses países não só os recursos financeiros, mas também a captação de conhecimento tecnológico ou naval, como se diz, para poderem depois operar na economia angolana.

Eu penso que a Coreia do Sul é um país que tem tudo para gerar uma boa parceria, uma vez  que é um país que tem uma visão diferente do continente africano africano, ao contrário da China, dos Estados Unidos ou até dos países europeus. A Coreia do Sul tem uma visão de estabelecimento de parcerias comerciais e não uma visão de imposição de uma agenda política. E talvez seja um parceiro adequado, como também é o Japão.

São países com os quais temos muito a aprender, sobretudo até na questão do ensino. A Coreia do Sul passou por uma revolução no sector de ensino e seria muito importante que Angola compreendesse como é que um país, em menos de 100 anos, passou de um país subdesenvolvido, para um país com alto desenvolvimento.

Na questão da diplomacia, há também uma tentativa de João Lourenço procurar outros parceiros para não ser tão dependente de países como a China e os Estados Unidos. Há essa intenção da parte do Presidente?

Há de facto essa intenção. O número de viagens que o Presidente tem feito demonstra a vontade de diversificar os velhos parceiros como a China, os Estados Unidos e também a Rússia. Penso que a Coreia do Sul, o Japão, mesmo o Brasil, são parceiros importantes para evitar a forte dependência de Angola com os velhos parceiros. Isto porque os países africanos têm normalmente uma forte dependência de alguns países, dependência que acaba por impactar a agenda interna, a estratégia e a soberania para pensar as relações internacionais de forma independente. Sem que a agenda externa se imponha sobre a realidade africana. Nesse aspecto, estou plenamente de acordo com essa política, porque afirma o princípio da soberania dos Estados.

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