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Tchalê Figueira: A irreverência e a denúncia na pintura de Cabo Verde

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Tchalê Figueira é um dos pintores da contemporaneidade cabo-verdiana. O artista imprime nas telas a sua irreverência, com um estilo expressionista de cores vivas e silhuetas exageradas, às vezes burlescas, muitas vezes políticas. Tchalê Figueira dá corpo, essencialmente, aos gritos e alegrias da condição humana. Fomos visitá-lo no seu atelier da histórica Casa Figueira, virada para o mar e para o Monte Cara, na cidade do Mindelo, em São Vicente.

Tchalê Figueira no seu atelier, Mindelo, 22 de Março de 2022.
Tchalê Figueira no seu atelier, Mindelo, 22 de Março de 2022. © Carina Branco/RFI
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Tchalê Figueira é um dos artistas incontornáveis da cidade de Mindelo. Nascido em 1953, na ilha de São Vicente, Tchalê Figueira mudou-se para a Suíça em 1974 para estudar na Basel School of Fine Arts, em Basileia. Em 1985, regressa à sua ilha. A sua obra já foi exposta na Europa e na África, mas também nos Estados Unidos e no Brasil. Em 2008, recebeu o prémio da Fundação Blachère na Bienal de Dakar.

O artista imprime nas telas a sua irreverência, com um estilo expressionista de cores vivas e silhuetas exageradas, às vezes burlescas, muitas vezes políticas. Tchalê Figueira dá corpo, essencialmente, aos gritos e alegrias da condição humana. Fomos visitá-lo no seu atelier da histórica Casa Figueira, virada para o mar e para o Monte Cara, na Avenida Marginal, conhecida como a Rua da Praia, em pleno centro do Mindelo.

Oiça aqui a entrevista 

15:12

Convidado Tchalê Figueira

No atelier, de portas e janelas abertas para a azáfama de uma das ruas mais mexidas da cidade, são muitas as telas em exposição, num acumular de imagens que remetem para a sua liberdade e necessidade de criação “compulsiva”.

Desenho muito, desenho muito, desenho muito. Pinto muito, pinto muito. Eu sempre fico, de uma certa forma, admirado de como é que todo este universo aparece dentro de mim. Tenho todas estas coisas dentro de mim”, conta.

O artista Tchalê Figueira no seu atelier, na Casa Figueira, em Mindelo. 22 de Março de 2022.
O artista Tchalê Figueira no seu atelier, na Casa Figueira, em Mindelo. 22 de Março de 2022. © Carina Branco/RFI

Célebres são as suas séries sobre ditadores, sobre as guerras, mas aqui há um universo também festivo, com pinturas de convívios e copos.

Quando morre qualquer pessoa, eu também morro porque eu sou parte da Humanidade. Eu não vejo só Cabo Verde, eu vejo o mundo”, explica.

Porém, “há séries sobre o vinho, há séries sobre o amor, há de tudo um pouco. Eu não posso ser um misantropo que odeia o mundo e as parvoíces dos homens no mundo. Eu também sei que há qualidades, há coisas bonitas nesse mundo. Escutar uma morna da Cesária Évora é fabuloso, escutar a Nona Sinfonia de Beethoven é uma coisa fabulosa. Há coisas boas neste mundo, nem tudo é podre.

Noutra sala, está "o cantinho" onde ele pinta, com as diferentes camadas de tinta que se foram fossilizando na parede. Ao lado, uma pintura que remete para o Ku Klux Klan porque as lições da história são esquecidas e os extremismos voltam sempre à tona.

Apesar de conseguir viver da sua pintura, Tchalê Figueira admite que ainda há uma sub-representação da arte africana nos museus europeus.

“Há, ainda, um certo preconceito sobre os artistas africanos. Ainda vêem a arte africana com um certo folclorismo, mas não é verdade. A arte africana contemporânea é muito expressiva e muito forte, cheia de conceitos e pensamentos intelectuais.”

Mais difícil ainda é nos países lusófonos onde “não há uma política forte para tentar mostrar aquilo que os países de língua portuguesa têm - principalmente o que os países africanos de língua portuguesa têm - para expor e propor em outras latitudes. Para nós, os ilhéus, ainda é pior”.

A pintura está no ADN familiar, tendo em conta que Tchalê Figueira é irmão do pintor Manuel Figueira, fundador da histórica cooperativa Rezistenza e depois do Centro Nacional de Artesanato, com Luísa Queirós e Bela Duarte.

Telas de Tchalê Figueira. Mindelo, 22 de Março de 2022.
Telas de Tchalê Figueira. Mindelo, 22 de Março de 2022. © Carina Branco/RFI

Tchalê Figueira pinta e desenha “compulsivamente”, mas também se expressa pela música, pela ficção e pela poesia. Publicou vários livros, como “Todos os naufrágios do mundo” (1992), “Onde os sentimentos se encontram” (1998), “O azul e a Luz (2001), “Moro nesta ilha há mais de cinquenta anos e outros contos” (2016), “Uma Pequena Odisseia Mindelense” (2016) e “Solitude Blues” (2016), entre outros.

Quando se mora numa ilha, para matar o tédio, a gente tem de ocupar o tempo com coisas, não é? Então, a gente está sempre à procura de coisas e isso talvez seja uma fonte de criatividade. Estar numa ilha e tentar criar coisas porque a única coisa que temos é o horizonte e olhar para o horizonte é tentar criar novos mundos e outras utopias.” Assim fala Tchalê Figueira. 

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