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Élisabeth Moreno: "Trabalhei toda a minha vida para estar onde estou"

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O governo francês lançou neste dia Internacional da Mulher a campanha #1000 possibilidades para apoiar e inspirar o futuro das 1000 bebés recém-nascidas nesta dia 8 de Março de 2021. Um projecto encabeçado por Élisabeth Moreno, ministra adjunta do primeiro ministro Jean Castex e ministra da Igualdade de Género, Diversidade e Igualdade de Oportunidades.

Ministra da Igualdade de Género, Diversidade e Igualdade de Oportunidades francesa, Élisabeth Moreno.
Ministra da Igualdade de Género, Diversidade e Igualdade de Oportunidades francesa, Élisabeth Moreno. © RFI
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RFI: O seu percurso académico e profissional é fulgurante. Quer falar-nos deste percurso entre o sector empresarial e a política?

Élisabeth Moreno: Não direi que o meu percurso foi fulgurante porque tenho cinquenta anos e tenho a ideia que trabalhei toda a minha vida para estar onde estou hoje. O meu percurso é o percurso de muitas pessoas que deixam o seu país.

Nasci em Cabo Verde em 1970 e cheguei a França quando tinha sete anos e desde esse momento não parei de trabalhar. Estudei muito porque já sabia que uma mulher, uma mulher negra que vive num país que não é o seu tem de estudar e trabalhar mais para ter um melhor futuro. A minha história é a história de muitas pessoas que emigram, quer sejam portugueses, angolanos, cabo-verdianos, moçambicanos. Todas essas pessoas que decidem um dia deixar o seu o país para procurar um futuro melhor, têm um sonho que os filhos tenham mais sucessos do que eles. Acho que os meus pais fizeram muitos sacrifícios para que a nossa vida fosse melhor do que a deles e tenho a sorte de viver num país que dá oportunidades a todas as pessoas. Estar hoje a assumir responsabilidades que são as minhas é uma coisa incrível que nunca pensei ou imaginei, mas é também um exemplo de que na vida tudo é possível se as pessoas têm fé.

Hoje assinala-se o dia Internacional do Direito das Mulheres, o seu ministério lança uma campanha, as 1000 oportunidades. Que campanha é esta?

Acho que a vida oferece muito mais do que 1000 oportunidades e que as mulheres que já tiveram a sorte de ter sucesso nas suas vidas têm a responsabilidade de dar a mão às jovens que hoje se levantam. A nossa ideia é que todas essas mulheres que lutam pela igualdade de género, que são modelos para muitas pessoas, escrevam uma carta que vamos entregar às 1000 bebés que vão nascer neste 8 de Março. A ideia é transmitir esperança, abertura e acompanhamento das nossas jovens para que elas saibam que tudo é possível com trabalho, coragem e resiliência.

Esta é a ideia deste programa #1000 possibilidades e vamos ainda reconhecer o trabalho extraordinário de associações que lutaram contra as discriminações feitas contra as mulheres. Escolhemos 18 mulheres e associações que fizeram um trabalho extraordinário no domínio da educação, cultura, artes, media, saúde, reconhecendo-lhes o trabalho.

Ministra da Igualdade entre Homens e Mulheres, Elisabeth Moreno
Ministra da Igualdade de Género, Diversidade e Igualdade de Oportunidades francesa, Élisabeth Moreno.
Ministra da Igualdade de Género, Diversidade e Igualdade de Oportunidades francesa, Élisabeth Moreno. © RFI

Que olhar tem a senhora ministra quanto a estas denúncias de incesto e de agressão sexual que se estão a levantar e cada vez mais, que envolvem figuras políticas? O problemas muitas vezes prende-se com a questão do acto de falar e da prescrição dos crimes e o governo francês está a tentar mudar a lei. As coisas estão realmente a mudar?

Acho que sim e já era tempo. Há muitos anos que as associações denunciam todas as formas de violências e com o movimento #metoo, nomeadamente, vimos uma mudança na nossa sociedade que agora está pronta a abrir os olhos e a aceitar que essas violências não podem existir em 2021. Eu quero dirigir-me às pessoas que sofrem para que sofram com dignidade (...) têm que falar, têm que denúncias, têm que fazer tudo o que é possível para que os seus direitos humanos sejam respeitados.

Em França, tenho a responsabilidade da população LGBT+, das mulheres, da igualdade de oportunidades e quero dizer-lhes que estamos prontos para ouvir, acompanhar, defender. Todos os governos do mundo deveriam fazer a mesma coisa. A libertação da palavra é muito importante para ser reconhecida como uma vítima e para que os nossos direitos sejam respeitados. Quero passar uma mensagem muito forte às mulheres que sofrem de violência conjugal, a violência conjugal não é uma fatalidade. As meninas que sofrem de incesto, esta violência não é uma fatalidade. Há direitos, há leis que as podem proteger das pessoa que não respeitam os seres humanos.

Por vezes, essas vítimas não sabem que são vítimas. O problemas poderá partir daí...

Temos que formar as pessoas que integram o sector da educação, da saúde, áreas que estão mais próximas das vítimas. Essas pessoas têm que ser capazes de perceber que algo está mal e de denunciar essas violências. As vítimas nem sempre têm consciência que são vítimas, mas o trabalho destas associações e destas pessoas, que trabalham no sector da educação e saúde, pode ajudar muito.

Falou das mulheres estarem na primeira linha de combate a esta crise. O governo francês vai lançar uma campanha para reduzir desigualdades e dar acesso gratuito a protecções menstruais. Muitos países começam a dar resposta a este problema do qual não se falava.

Absolutamente. A primeira discriminação universal é a discriminação contra as mulheres e a precariedade afecta sobretudo as mulheres. Em França temos uma grande vontade de lutar contra a precariedade menstrual porque temos mais de dois milhões de mulheres quer sejam estudantes, em situação de sem abrigo ou reclusas, que não têm possibilidade de comprar protecções higiénicas. Esta é uma questão tão urgente que decidimos investir 5 milhões de euros para que estes bens de primeira necessidade sejam gratuitos para estas mulheres.

A nossa ministra do Ensino Superior, Frédérique Vidal, decidiu que a partir de 2021 as estudantes iriam receber gratuitamente estas protecções porque é uma questão de saúde pública e não é possível deixar mulheres em situação de precariedade menstrual, que é uma coisa muita natural. Devo lembrar, que sem a menstruação, que é vista como um tabu, não há vida. Temos que proteger as mulheres, com todas as possibilidades, e estou muito feliz que tenhamos tomado esta decisão. 

É um orgulho para si estar a ocupar este cargo, ter a oportunidade de transformar e estar ao lado das mulheres?

É uma responsabilidade e é um orgulho. É um orgulho porque sou filha de cabo-verdianos. Nasci em Cabo Verde, vim para França com sete anos e passei a minha vida a lutar. Se hoje tenho a possibilidade de trazer ao governo a minha experiência de filha de pessoas emigradas, que sabem como a vida pode ser difícil, e poder mostrar que na vida tudo é possível.

Sim, é um orgulho. Quando as pessoas fazem um sacrifício imenso - como os meus e outros pais fizeram - para que os seus filhos cheguem a um cargo de ministro, num país no qual não nasceram. É acima de tudo uma responsabilidade porque quero que outras pessoas, como eu, tenham a possibilidade de um dia fazer a mesma coisa.

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