A tabanca é uma tradição secular de Cabo Verde que resistiu à perseguição e é celebrada ainda hoje em alguns bairros das ilhas de Santiago e do Maio. Mais do que uma festa comunitária, com ritos religiosos e profanos, música e dança, é uma associação de vizinhos que se entreajudam ao longo do ano. No fundo, “a tabanca é um sentimento” que “traz consigo toda a história da génese do cabo-verdiano” e o objectivo é apresentá-la como candidata a património imaterial da UNESCO, explica o antropólogo Carlos Alberto Barbosa.
O som da corneta é central nas festas da tabanca. Stefanina aprendeu a tocar aos sete anos e rompeu a tradição que reservava aos homens os ritmos dos tambores e da corneta nos desfiles da Tabanca da Achada de Santo António. A ilha de Santiago é uma das que manteve viva esta tradição, juntamente com a ilha do Maio.
Há documentos que apontam para a existência de tabancas já no século XVII. Se resistiram até hoje é porque são muito mais que uma tradição, são “um sentimento”, explica o antropólogo Carlos Alberto Barbosa para quem “a tabanca traz consigo toda a história da génese do cabo-verdiano”.
Reportagem: "A Tabanca é um sentimento"
A tabanca está profundamente ligada à essência cabo-verdiana. Traduz-se em ritos e rituais, entreajuda, festa, teatro e música dentro das comunidades que resistiram às perseguições de que foram alvo ao longo dos séculos. É que esta organização era vista como um perigo. Primeiro, porque nasceu no âmbito da sociedade escravocrata e os escravos recriaram, em festas, toda a hierarquização social, o que poderia fomentar uma “revolta”. Depois, esta possibilidade de insurreição manteve-se ao longo do tempo, até à sociedade colonial, o que levou a muitas perseguições e proibições ao longo do tempo.
Carlos Alberto Barbosa realizou o documentário “Tabanka ka ta kaba” que tem levado a tabanca a vários festivais internacionais. O realizador trabalha no Instituto do Património Cultural de Cabo Verde que quer ver a tabanca classificada pela UNESCO como Património Imaterial da Humanidade. Requisitos não faltam, argumenta Carlos Alberto Barbosa, começando por apontar que a tabanca já foi reconhecida como património nacional e que “traz consigo toda a história da génese do cabo-verdiano”, com rituais e rezas que são “uma mescla de Europa com África”.
João Pedro de Carvalho, presidente da Tabanca da Achada de Santo António, na Praia, abriu-nos a capela da comunidade, decorada como búzios e tambores, mas sem o santo padroeiro que foi levado para a casa de um membro da tabanca que morreu recentemente.
Na Tabanca da Achada de Santo António todos falam em “brincar à tabanca”, mas a brincadeira está a ficar cada vez mais séria perante a possibilidade de ser reconhecida pela UNESCO. Dentro de portas, a tabanca já foi reconhecida como património imaterial. O próximo passo é obter o reconhecimento mundial, ainda que o impacto económico da pandemia de covid-19 tenha suspendido, este ano, o projecto de candidatura à Unesco por falta de verbas.
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