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Confrontos/Guiné-Bissau

Guiné-Bissau: "Há a necessidade de reformar as Forças de Segurança"

Bissau – Na Guiné-Bissau, dois militares perderam a vida e dois outros ficaram feridos, na sequência de confrontos entre agentes da Guarda Nacional e membros do Batalhão do Palácio presidencial. A informação foi avançada por fontes da Polícia Militar guineense, que dá conta de que os momentos de violência ocorreram durante a madrugada de quinta-feira e também na manhã de sexta-feira.

Bissau, 28 de Julho de 2022.
Bissau, 28 de Julho de 2022. AFP - LUDOVIC MARIN
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Segundo avançou a mesma fonte, os dois mortos tratam-se de um elemento da Guarda Nacional e um membro do Batalhão presidencial.

Esta sexta-feira, o Estado-Maior das Forças Armadas, disse que a "situação voltou à calma" e que esta situação tinha sido provocada pela actuação do Comandante da Guarda Nacional, Vítor Tchongo, ao mandar libertar os dois membros do governo detidos na Polícia Judiciária (PJ).

Fontes militares avançaram que o Comandante da Guarda Nacional e mais alguns elementos da corporação foram detidos e levados para o quartel do Estado Maior General das Forças Armadas, no centro de Bissau. Estas mesmas fontes indicaram que o ministro da Economia e Finanças da Guiné-Bissau, Suleimane Seidi, e o secretário de Estado do Tesouro, António Monteiro, voltaram a ser levados para a prisão, após terem sido libertados na noite passada por elementos da Guarda Nacional.

Este sábado, os partidos políticos guineenses já reagiram a estes últimos acontecimentos e, da oposição aos partidos no Governo, todos condenaram a actuação do Comando da Guarda Nacional. O Madem G-15 fala mesmo numa "tentativa de golpe de Estado".

Em entrevista à RFI, Luís Vaz Martins, antigo Presidente da Liga guineense dos Direitos Humanos, e também advogado, reagiu aos confrontos que ocorreram na Guiné-Bissau, salientando que este é mais um episódio que retrata a instabilidade que se vive no país e defendeu a necessidade da reforma das Forças de Defesa e Segurança para evitar que situações semelhantes se repitam no futuro.

"Na minha perspectiva, este é mais um acontecimento, de vários que têm marcado os tristes episódios de instabilidade na Guiné-Bissau. O incidente deu-se com o assalto à Polícia Judiciária por parte de homens da Guarda Nacional. No passado, já tinham existido situações destas de assalto à Polícia Judiciária, que, inclusivamente, resultou na morte de um agente", começou por referir o nosso entrevistado.

Luís Vaz Martins recordou depois outro episódio semelhante: "Houve também no passado, em 2008, o assalto ao próprio Ministério do Interior, que resultou na morte de um polícia".

"É nessa base que nós, tristemente registámos, esta quinta-feira, mais um assalto a uma instituição, por forma a libertar duas pessoas que se encontravam lá sob custódia do Ministério Público. Nessa perspectiva, chamo à colação, a necessidade de reforma das Forças de Defesa e Segurança, de forma a evitar estas situações, que só colocam em causa a paz social e atormentam, na realidade, a vida dos civis inocentes, que nada têm a ver com essa situação, de constantes instabilidades, que levam a situações de assalto a instituições da República, como o que aconteceu também recentemente, com o assalto à própria sede do poder judicial, que nós simplesmente temos de lamentar e condenar", rematou o ex-Presidente da Liga guineense dos Direitos Humanos.

Ouça aqui a primeira parte da entrevista a Luís Vaz Martins:

 

01:18

Som Luís Vaz Martins, Guiné-Bissau, 02-12-2023

 

O advogado também disse, em entrevista à RFI, que não considera que estejamos perante uma "tentativa de golpe de Estado", tal como referiu o Madem G15.

"Não me parece. Eu dei exemplos concretos de incidentes no passado que levaram à intervenção de forças de ordem, sobretudo dos militares, às instituções, como a Polícia Judiciária e o próprio Ministério do Interior. No passado, todos esses incidentes não foram traduzidos numa interpretação que levam a crer uma tentativa de golpe de Estado. Não me parece também que esta seja", salientou.

Luís Vaz Martins contextualizou depois tudo o que aconteceu: "Aquilo que aconteceu é que não houve qualquer tiro de arma de fogo durante o assalto às instituições da Polícia Judiciária. Limitaram-se a libertar os dois membros do governo e retiraram-se para a sede da Guarda Nacional. E depois a tentativa da outra força é que levou àqueles conflitos".

"Não me parece [que se trate de uma tentativa de golpe de Estado] porque estando a própria Polícia Judiciária sob dependência do governo, se fosse a pretensão do executivo libertar os dois membros do governo, não necessitava de chamar a intervenção da Guarda Nacional. Basta dar ordens ao director da Polícia Judiciária para libertar os ministros. Ou se a intenção fosse transferir os ministros para instalações da Guarda Nacional, a Guarda Nacional, também está sob a dependência do próprio governo. Não me parece que esta seja, propriamente, uma interpretação. Quando acontecem estas coisas, há toda uma tendência de instrumentalizar e politizar o discurso no sentido de tirar proveitos", concluiu, em entrevista à RFI.

Ouça aqui a segunda parte da entrevista:

 

01:21

Som 2 Luís Vaz Martins, Guiné-Bissau, 02-12-2023

 

Este sábado, o Governo lamentou, em comunicado, a "actuação da Procuradoria Geral da República", caracterizada pela "violação flagrante de regras processuais na audição e detenção do Ministro da Economia e Finanças e do Secretário de Estado do Tesouro, enquanto membros do Governo". 

Manifestando o seu "profundo sentimento pelas perdas humanas registadas", o Governo exortou ainda "a Comunidade Internacional em geral e a CEDEAO, em particular, a acompanhar o Governo no seu esforço para garantir a segurança e a estabilização do país".  

O Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), um dos partidos no poder, emitiu um comunicado, algumas horas antes, sobre o assunto, e lamentou "os intensos tiroteios verificados, que além de terem resultado em mortes e feridos a confirmar, colocaram a população guineense em pânico".

O partido exortou ainda o Ministério Público a respeitar "os procedimentos de audição estabelecidos por Lei, em matéria de apuração de factos e da observância dos prazos e medidas preventivas".

O PAIGC condenou depois "a actuação da corporação da Guarda Nacional, por ter forjado a libertação do Ministro da Economia e Finanças e o secretário de Estado do Tesouro, nas instalações prisionais da Polícia Judiciária" e condenou também "a presença de um corpo de militares fortemente armados nos arredores da residência do Presidente da Assembleia nacional Popular, Líder do PAIGC e da Coligação PAI-Terra Ranka, Domingos Simões Pereira, no dia 1 de Dezembro".

O partido também condenou "o Madem G-15 e alguns partidos sem assento parlamentar pela postura anti-democrática e belicista, que vem caracterizando as suas intervenções, numa clara afronta às regras de um Estado de direito Democrático, com a agravante de estar, recorrentemente, a solicitar ao Presidente da República a demissão de um governo, constituído na base da maioria folgada de 2 terços".

Por fim, o PAIGC, "encoraja o chefe de governo, Dr. Geraldo João Martins, no sentido de disponibilizar todos os membros do governo envolvidos no processo a colaborarem com as instâncias judiciais no apuramento dos factos".

"O PAIGC apela à calma e, mais uma vez, ao respeito pelo veredicto popular das urnas, reassumindo o seu engajamento pelo acatamento das decisões judiciais, sendo que volta a apelar que as mesmas decorram da observância dos actos processuais legalmente instituídos", pode ler-se na parte final do comunicado.

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