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Cabral 50 anos

A noite em que aconteceu o assassínio de Amílcar Cabral

Assinalam-se esta sexta-feira os cinquenta anos do assassínio em Conacri de Amílcar Cabral, fundador do PAIGC, Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde. O líder independentista, formado em agronomia, conduzia desde 1960, a partir de Conacri, a luta contra o regime colonial português. Acabaria por ser mortalmente baleado a 20 de Janeiro de 1973 por membros do seu partido, em circunstâncias ainda por esclarecer.

Amílcar Cabral em Cuba em 1970.
Amílcar Cabral em Cuba em 1970. © AFP
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Na noite de 20 de Janeiro de 1973, Amílcar Cabral foi assassinado em Conacri, por membros de seu próprio partido, diante da sua casa. Nesse dia, Cabral tinha participado numa reunião do seu partido juntamente com uma delegação da Frelimo (Frente de Libertação de Moçambique) na capital da Guiné-Conacri, então uma das plataformas da luta anti-colonial em África. Após este encontro, o líder independentista tinha ido a uma recepção dada na Embaixada da Polónia antes de regressar à sua residência. Foi ao estacionar a viatura diante de casa, por volta das 22h30, que foi atacado e assassinado por alguns correligionários, nomeadamente Inocêncio Cani, companheiro de luta de Cabral que terá dado o primeiro tiro. 

Divisões no seio do partido fundado por Amílcar Cabral são até agora o motivo invocado para este assassínio."Se alguém me há-de fazer mal, é quem está aqui entre nós. Ninguém mais pode estragar o PAIGC, só nós próprios" profetizava o líder independentista que, apesar de já noutras ocasiões ter sido alvo de tentativas de assassínio, movimentava-se frequentemente sozinho. Até agora permanecem por desvendar todos os factores que conduziram à morte de Amílcar Cabral. A PIDE/DGS, a polícia política portuguesa, não fazia mistério de que o considerava como um dos principais inimigos do regime colonial. Esta pista tem sido privilegiada por alguns estudiosos sem que se tenha chegado a conclusões cabais.

Sekou Touré anuncia a morte de Amílcar Cabral

No dia a seguir, o então Presidente da Guiné-Conacri, Sekou Touré, anunciou a morte de Amílcar Cabral. "Povo da Guiné, povo de África, povo do mundo, valentes combatentes da liberdade. O imperialismo acaba de cometer um dos crimes mais hediondos, mais ignóbeis no território livre da República da Guiné. Amílcar Cabral, secretário-geral do PAIGC, caiu neste sábado 20 de Janeiro de 1973, às 22H30, diante da sua própria casa, cobarde e horrívelmente assassinado pelas mãos envenenadas do imperialismo internacional e do colonialismo português. Cabral vem prolongar a funesta lista das vítimas do imperialismo e da sua quinta coluna. Cabral vive e viverá através do nosso combate pelo progresso constante da pátria africana" disse Sekou Touré ao anunciar um luto nacional de dois dias.

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Discurso de Sekou Touré no dia 21 de Janeiro de 1973, na sequência da morte de Amílcar Cabral

Com a morte de Cabral, o combate não terminou. Um dos seus companheiros, Aristides Pereira, substituiu-o na liderança do PAIGC e a luta armada intensificou-se até a Guiné-Bissau proclamar unilateralmente a sua independência a 24 de Setembro de 1973. Luís de Almeida Cabral, meio-irmão do líder independentista, é nomeado primeiro presidente do país. A 5 de Julho de 1975, depois da revolução do 25 de Abril de 1974 em Portugal, é a vez de Cabo Verde também alcançar a liberdade.

1973: ano de balanço de 10 anos de luta armada

Dias antes de ser assassinado em Conacri, o líder independentista dirigiu a 1 de Janeiro de 1973, através da 'Rádio Libertação', uma mensagem de ano novo à população de Cabo Verde e da Guiné-Bissau. Nesta que seria a sua última comunicação, Cabral enalteceu as conquistas obtidas após dez anos de luta de libertação.

"Da situação de colónia que dispõe de um movimento de libertação e cujo povo já libertou em dez anos de luta armada a maior parte do seu território nacional, vamos passar à situação de um país que dispõe do seu Estado e que tem uma parte do seu território nacional ocupada por forças armadas estrangeiras. Esta mudança radical na situação da nossa terra corresponde à realidade concreta da vida e da luta do nosso povo na Guiné. Baseia-se nos resultados concretos da nossa luta e tem o firme apoio de todos os países e governo africanos e de todas as forças anticolonialistas e anti-racistas do mundo. Ela corresponde também aos princípios da Carta das Nações Unidas e às resoluções adoptadas por essa organização internacional nomeadamente na sua 27ª sessão. Nada, nenhuma acção criminosa ou manobra ilusionista dos colonialistas portugueses, poderá evitar que o nosso povo africano, dono do seu próprio destino e consciente dos seus direitos e deveres, dê esse passo transcendente e decisivo para a realização do objectivo fundamental da nossa luta: a conquista da independência nacional e a construção, na paz e na dignidade reconquistadas, do seu progresso verdadeiro", disse Amílcar Cabral na sua longa mensagem de ano novo.

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Ultimo discurso de Amílcar Cabral, no dia 1 de Janeiro de 1973

Ao evocar a elaboração de uma constituição e a criação de assembleias em Guiné-Bissau, Cabral expunha neste discurso o projecto de construir um Estado Binacional que juntasse a Guiné-Bissau e Cabo Verde. Um projecto que ainda sobreviveu alguns anos após a independência, até ambos os países se desvincularem, na sequência do golpe de Estado perpetrado por João Bernardo Vieira na Guiné-Bissau a 14 de Novembro de 1980.

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