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Ciência

Start-up moçambicana quer biovaletas sustentáveis em Maputo

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A arquitecta moçambicana Khiusha Uaila é a mentora da Xi Bassile, uma start-up que quer implementar biovaletas com materiais reciclados para uma gestão mais sustentável das águas pluviais. A iniciativa chegou à final da ClimateLaunchPad, uma competição internacional que apoia ideias de negócios verdes. O objectivo, agora, é implementar o projecto-piloto num bairro de ocupação informal em Maputo.

Projecto Xi Bassile
Projecto Xi Bassile © Khiusha Uaila
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O projecto Xi Bassile nasceu durante o mestrado,na Irlanda, da jovem moçambicana Khiusha Uaila, no âmbito do curso de Arquitectura, Urbanismo e Acção Climática. Antes disso, ela formou-se como arquitecta e urbanista na Universidade Federal de Santa Catarina, no Brasil. Depois dos estudos no estrangeiro, Khiusha Uaila voltou para Maputo, onde tem trabalhado como arquitecta e agora quer implementar um projecto que ajude a gerir a água da chuva e as inundações.

 

“RFI: O que é a Xi Bassile?”

Khiusha Uaila, Arquitecta: A Xi Bassile é uma empresa social, é uma ‘start-up’ que está agora na sua fase de pesquisa e desenvolvimento de produto. Temos a missão de focar em soluções sustentáveis e baseadas na natureza para resolver problemas urbanos. Focamos agora, principalmente, na gestão de águas fluviais com a solução da biovaleta e, também, com uma solução de um kit simplificado de recolha de água da chuva. A intenção, à medida que a gente for crescendo, é trabalhar com diversas outras soluções, incluindo consultoria em projectos urbanos.”

 

“Em que consiste essa biovaleta sustentável?”

“Essa biovaleta foi um produto do meu mestrado. Biovaletas são soluções que já existem há algumas décadas, apesar de não serem ainda a solução mais recorrente. É um sistema de gestão de águas pluviais que utiliza os solos e a vegetação para absorver e também para filtrar a poluição das águas da chuva.

É uma solução mais sustentável que está baseada na natureza e também ajuda na regeneração ambiental, além de reproduzir o ciclo natural da água, mantendo um ecossistema um bocadinho mais equilibrado em comparação com as soluções mais convencionais de engenharia que a gente tem nas cidades e que simplesmente têm o objectivo de retirar a água da chuva das áreas urbanas o mais rápido possível.”

 

“A biovaleta também usa material reciclado?”

“Isso é a inovação da nossa valeta na Xi Bassile porque reutilizamos resíduos sólidos - podem ser garrafas Pet, podem ser betão reciclado de lixo de construções e demolições - como elementos constitutivos dentro do sistema da biovaleta para aumentar a porosidade do sistema e, assim, aumentar a capacidade de absorção e aumentar a capacidade de armazenamento temporário dessa água da chuva, reduzindo a inundação e água estagnada nas superfícies das ruas.

Então, é uma solução de baixo custo, sustentável e baseada na natureza. É uma abordagem completamente diferente do que tem sido feito ultimamente nas cidades moçambicanas e que se baseava em estruturas feitas em betão, que também é um material poluente, que no seu processo de fabricação emite bastantes gases que contribuem para as mudanças climáticas. A gente tenta buscar uma abordagem mais sustentável para resolver esses problemas urbanos que são tão recorrentes nas cidades moçambicanas, infelizmente.”

 

“Relativamente ao kit de recolha de águas das chuvas, as pessoas poderão ter acesso a este kit?”

“Na verdade, é uma versão simplificada de armazenamento de água da chuva, mas que tem uma componente de filtragem. Utiliza areia e membranas geo-têxteis para armazenar e filtrar a água da chuva. Muitas vezes, é um grande problema quando se trata de recolher água da chuva porque essa água recolhida vem cheia de sujidades e isso restringe um bocadinho a utilização daquela água.

Esta é uma solução que foi inspirada num estudo desenvolvido pela Universidade de Brasília que estudou diferentes materiais alternativos e de baixo custo para soluções de drenagem e de gestão de água.

Com base nisso, a nossa ideia é fazer um projecto-piloto onde se faz a implementação dessas duas soluções em paralelo: a biovaleta que ajuda a fazer a gestão das águas fluviais e o kit de recolha de água da chuva que ajuda a reduzir a quantidade de água que chega no chão e, consequentemente, ajuda a aliviar a pressão no sistema de drenagem pluvial urbano.”

 

“Ainda está na fase experimental. Quando é que esse projecto-piloto pode ser implementado?”

“Nós temos um plano de acção que envolve um projecto de aproximadamente 42 meses. Os primeiros seis meses são o desenvolvimento e a análise do protótipo. Depois, nos meses seguintes, é o projecto-piloto propriamente dito, que é a implementação dessas soluções, através de um processo participativo que inclui os moradores de um bairro de baixa renda que é onde a gente gostaria de iniciar os nossos trabalhos. Seria um bairro de ocupação informal porque existem muitos em Maputo que têm uma carência muito grande de infra-estrutura urbana e o foco principal dos nossos produtos é justamente essas regiões que estão em situação mais crítica e que também têm menos recursos e poderiam aproveitar-se desta solução que é de baixo custo.

É importante trabalhar o lado social, por isso, a ideia é fazer a implementação dessas duas soluções através desse processo participativo que engaja a comunidade em actividades de transferência de conhecimento e de capacitação também dos residentes que estiverem interessados em participar na construção e na manutenção das biovaletas.

Depois disso, a gente teria evidências suficientes tanto da performance em termos mais técnicos das soluções, quanto do impacto social e ambiental que elas podem ter. A partir daí, poderemos expandir a nossa produção.”

 

“Este é um sistema de drenagem urbana sustentável. O saneamento e gestão de águas pluviais é um problema em Maputo e não só que também tem a ver com a expansão urbana e a construção desordenada de casas. O projecto Xi Bassile não é uma gota de água no oceano estrutural de problemas de gestão de água no país?”

“Infelizmente sim. Os problemas são muitos e complexos e têm que ser abordados de uma forma sistémica. Esta é uma contribuição, não é a solução que vai trazer a resposta a tudo, mas é uma solução que vai contribuir para uma série de esforços que precisam de ser feitos em simultâneo para melhorar a situação nas cidades.

A questão do ordenamento territorial é extremamente importante. Hoje em dia, a gente tem ocupações em áreas indevidas que bloqueiam linhas naturais de escoamento da água e isso é algo que tem que ser atacado e combatido porque se se continua a construir e a ocupar terras da forma como tem sido feito até agora, realmente, por mais que apareçam novas soluções como a Xi Bassile propõe, não vai ser algo que vai trazer uma solução. Mas, trabalhando em conjunto, é muito importante que haja esse tipo de soluções que são mais sustentáveis e que utilizam a natureza como suporte.

Em termos de gestão de águas pluviais, eu acredito que é o caminho a seguir: infra-estruturas verdes e soluções baseadas na natureza são uma estratégia muito forte para fazer a regeneração ambiental que é necessária, tanto fora quanto dentro das cidades.”

 

“O que significa Xi Bassile?”

“Xi Bassile significa ‘está limpo’ em Changana, uma língua do sul de Moçambique. O que a gente visualiza na ‘Xi Bassile’ é um caminho tão limpo quanto a água. A gente quer tanto que as nossas estradas sejam bonitas e bem mantidas, quanto que a nossa água seja gerida de uma forma sustentável e eficiente e que esteja em harmonia com os ecossistemas. Por isso, xi bassile, tá limpo!”

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