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Polónia: Activistas russos ajudam refugiados ucranianos

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São muitos os russos a deixar o país desde que a Rússia invadiu a Ucrânia, no passado dia 24 de Fevereiro. A reportagem da RFI foi a Varsóvia conhecer as histórias de Olga, Maxime e Alexander. Três activistas políticos que chegaram à Polónia para pedir asilo político e hoje ajudam refugiados ucranianos.

Imagem do Presidente Volodomir Zelensky e da bandeira da Ucrânia num café em Varsóvia, Polónia.
Imagem do Presidente Volodomir Zelensky e da bandeira da Ucrânia num café em Varsóvia, Polónia. © RFI
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Quando a guerra começou Olga, 21 anos, ainda saiu às ruas de Moscovo para protestar contra uma guerra que diz não compreender, mas logo percebeu que a única porta de saída era fugir do país. Numa corrida contra o tempo -para reunir os documentos necessários- a família em Varsóvia ajudou com os vistos humanitários. Para trás ficaram os pais e o irmão mais novo.

Olga está na Polónia desde Março e vive com a irmã mais velha, recebe-nos num café da capital polaca. Nas janelas, as bandeiras da Ucrânia e uma imagem de Volodymyr Zelensky demonstram os sinais de apoio a um país que acaba de entrar no quinto mês de guerra.

“Cheguei à Polónia em Março com a minha irmã mais velha. Em Moscovo ficaram os meus pais e irmão mais novo. Quando a guerra começou fomos para a rua para protestar, mas logo nos apercebemos que tínhamos de deixar o país. Inicialmente pensámos em ir para o Uzbequistão ou outro país da região, mas a nossa mãe estava preocupada porque o Uzbequistão não é um país muito seguro.

Depois, uns familiares, que moram na Polónia, contactaram-nos e disseram que podiam ajudar-nos a conseguir um visto humanitário. Foi uma corrida contra o tempo, tivemos de fazer tudo muito rápido, porque o espaço aéreo estava a fechar. Passámos uma semana a juntar todos os documentos e reservamos um voo para a Arménia, onde ficámos algum tempo a viver em casa de uns amigos distantes da nossa família, que vive na Polónia. Mais tarde, viajámos de autocarro para a Geórgia e na manhã seguinte apanhámos um avião para a Polónia”.

Maxim chegou a Varsóvia no dia 4 de Março. O jovem de 19 anos conta que quando a guerra começou, ele e o irmão, sabiam que ia ser complicado ficar no país. Decidem viajar numa primeira fase para a Turquia, mas Maxim decide deixar o irmão e seguir outro caminho.

“Quando a guerra começou, eu e o meu irmão percebemos que seria muito complicado para as nossas vidas se ficássemos no país. Primeiro viajámos para a Turquia, onde o meu irmão ficou, e eu decidi vir para a Polónia. Não foi muito fácil chegar até aqui. No aeroporto, fizeram-me várias perguntas, eu era o único cidadão com passaporte russo no avião, mas acabaram por me deixar embarcar.

Quando estava na Turquia não sabia muito bem o que poderia fazer para ajudar os ucranianos. Mas depois acabei por conhecer outros exilados políticos russos que me disseram que podia ir para a Polónia ajudar os ucranianos e foi o que fiz. Neste momento, faço voluntariado num centro de refugiados junto à fronteira. Ajudo os ucranianos que querem ficar na Polónia ou ir para outros países”.

O passaporte russo pode, por vezes, ser um problema, admite Olga. A jovem actvista conta que quando chegou ao Centro de Refugiados em Medica na fronteira polaca com a Ucrânia, onde foi voluntária durante dois meses, as autoridades não foram muito receptivas.

“Quando lhe dás o passaporte e eles veem que és da Rússia dizem: oh já temos tantos voluntários e não precisamos de mais. Ou então dizem que não nos podem aceitar porque somos cidadãos russos e quando lhe perguntamos porquê? Eles respondem que nós temos de perceber que há muita gente a querer ajudar. No entanto, quando chegam voluntários do Reino Unido e dos Estados Unidos eles quase que entram em êxtase e agradecem o facto de eles quererem ajudar”.

Ainda assim, a jovem activista não desistiu e hoje faz voluntariado à distância. Olga explica que se serve da rede de contactos que tem em vários países do mundo para ajudar os refugiados ucranianos que precisam de encontrar um abrigo ou receber cuidados médicos.

“O meu trabalho é encontrar hospitais e abrigos em outros países para os refugiados ucranianos. Como tenho muitos contactos é mais fácil encontrar a pessoa certa para os ajudar nas diferentes fases deste processo, fazendo com que eles recebam a ajuda que precisam. Estou a ajudar na comunicação e nas traduções. Na maior parte das vezes, eles não podem ficar na Polónia porque o país está sobrelotado, para tratar de algumas doenças, como traumas de guerra.

Existe uma lista de espera de seis anos e é por isso que tentamos procurar outros países como a Alemanha ou a Suíça para que possam receber tratamento médico. Esta guerra deixou-me horrorizada e a única solução que eu encontrei para lutar contra isto foi ajudar o povo ucraniano, sinto-me melhor em saber que estou a ajudar. A Polónia ajudou-me e eu consegui fugir da Rússia e agora tenho o dever de retribuir essa ajuda”.

Perguntámos a Olga se tenciona um dia regressar à Rússia e a jovem responde que será muito difícil voltar nos próximos tempos, sublinhando que corre o risco de ser enviada para a cadeia.

“Se o governo se mantiver, eu não posso voltar porque seria imediatamente enviada para a cadeia. Eu também não escondi o facto de estar a fazer voluntariado. É público! Por isso, eu sei que sou presa se regressar. Mas se o governo mudar talvez possa. Mas a meu ver, nos próximos anos ficarei aqui sem qualquer oportunidade de poder regressar”.

Desde o início da guerra, milhares de russos foram detidos por protestarem contra a invasão da Ucrânia. Neste país, o silêncio ou um cartaz em branco podem levar a 15 anos de prisão.

Alexander tem 36 anos, teve de fugir do país por causa do activismo político e pelo apoio ao opositor Alexei Navalny.  Em Janeiro, Alexandre foi convocado pelo gabinete de Segurança Federal russo para um interrogatório.

“Eles pediram-me para trabalhar para eles. Queriam saber informações sobre os activistas políticos, sobre a igreja católica, à qual pertenço, eu sou católico. Eles queriam saber o que é que o padre diz na missa. Queriam que eu fosse um espião e que desacreditasse a igreja católica e a oposição". Não tinha outra solução se não fugir do país porque eu não queria ir para a prisão, eu não fiz nada de errado. Eu estava apenas a opor-me à política de Putin, à elite que tem muito poder.

Na Rússia não há futuro, não há liberdade. Para mim, a única solução foi fugir.  Na Rússia a justiça não é independente, não tens possibilidade de te defender do regime de Putin. É triste, mas é a verdade. A oposição russa está devastada neste país. Boris Nemtsov foi assassinado, Alexei Navalny está na prisão, outros opositores vivem no estrangeiro. Na Rússia é preciso ter muita coragem para ir para a rua manifestar-se, mas nós podíamos tentar afastar Vladimir Putin do seu trono”.

Na Polónia, país onde pediu asilo político, Alexander já viveu em dois campos de refugiados, experiência que nem sempre correu da melhor forma.

“Cheguei em Janeiro. Primeiro fiquei num campo de refugiados, junto à fronteira polaca com a Bielorrússia, havia muitos ucranianos e pessoas de outros países. Não era mau, tínhamos direito a comer três refeições e eu sentia-me bem e em segurança. Mas queria viver perto de uma grande cidade porque ali era mais complicado para apanhar transportes, então decidi ir para outro campo de refugiados. O segundo campo de refugiados foi uma má experiência por causa dos muçulmanos do Afeganistão, Síria e Tchetchênia. Nesse campo havia uma espécie de lei da xaria e eles eram muito agressivos comigo pelo facto de eu ser católico. Senti que a minha vida estava em perigo. Foi então que decidi pedir à igreja católica para me ajudar a encontrar um lugar onde me sentisse em segurança. Um padre ajudou-me e uma família aceitou receber-me na sua casa”.

Alexander vive agora numa cidade nos arredores de varsóvia e é voluntário numa escola onde ensina inglês às crianças refugiadas.

“Na minha cidade vivem mais de dois mil ucranianos, na sua maioria mulheres e crianças. As crianças vão às escolas polacas, onde aprendem a falar inglês e alemão. Como estavam a precisar de ajuda para ensinar inglês básico, como o alfabeto, eu ofereci-me para ajudar. Não tenho muita experiência, mas estou a tentar dar o meu melhor por eles que tiveram de fugiram de uma guerra pela qual eu também me sinto responsável”.

Maxim também sente o peso da responsabilidade desta guerra que trouxe à superfície o lado mais negro da humanidade. O jovem activista espera que Vladimir Putin seja obrigado a prestar contas à justiça.

“Eu não desejo que Vladimir Putin morra. Quero apenas que ele seja julgado por tribunais internacionais e que seja considerado culpado pelos crimes de guerra”.

A Invasão russa da Ucrânia foi condenada pela comunidade internacional, o presidente norte-americano, Joe Biden, defendeu que o líder russo, Vladimir Putin, devia ser julgado por crimes de guerra.

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