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“Eleições vão trazer uma solução política para o país”

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Os portugueses elegem este domingo, 30 de Janeiro, um novo Governo para o país, eleições antecipadas depois do Parlamento não ter validado o Orçamento Geral de Estado. O jurista e investigador português, Nuno Cunha Rolo, afasta o cenário de maioria absoluta, mas defende que o acto eleitoral vai trazer uma solução de governabilidade política para Portugal.

Os portugueses elegem este domingo, 30 de Janeiro, um novo Governo para o país, eleições antecipadas depois do Parlamento não ter validado o Orçamento Geral de Estado.
Os portugueses elegem este domingo, 30 de Janeiro, um novo Governo para o país, eleições antecipadas depois do Parlamento não ter validado o Orçamento Geral de Estado. © Patricia de Melo Moreira, AFP
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Estas eleições serão capazes de trazer uma solução política para o país? 

Tem de se encontrar uma solução política para o país, pelo menos a nível de governabilidade. Não acredito que haja uma maioria absoluta, nenhuma sondagem dá uma maioria absoluta a nenhum partido, nomeadamente ao incumbente- partido socialista. Nas últimas sondagens temos uma situação de empate técnico entre o PS e PSD.

A solução deverá passar por um partido que ganha, mas que será minoritário, percebendo depois se iremos para cenários de coligações ou se há acordos de incidência parlamentar. Também se pode ir para um tipo de governação que ficou conhecida como “governação à António Guterres”, dependente de acordos pontuais entre os deputados. 

Dezanove partidos concorrem nestas legislativas. É o reflexo de uma democracia activa ou revela um descontentamento com a actual classe política? 

Há vários partidos a concorrer e isso resulta de vários factores, nomeadamente do nosso sistema eleitoral. É um sistema eleitoral proporcional, o que significa que dá maior possibilidade a partidos pequenos de atingirem o Parlamento, nas eleições legislativas e até o governo no caso de coligação com outros partidos.

A participação de vários partidos significa também que as pessoas não se reveem nos partidos mais tradicionais, é verdade, mas também é um sinal de uma democracia que se está a consolidar. Até porque a institucionalização dos partidos políticos -o facto de entrarem nestes processos democráticos, entrarem na Assembleia da República,  e perceberem os mecanismos institucionais- pode moderar os próprios partidos.

Há ainda outra questão, que tem a ver com o aumento dos partidos extremistas ou populistas, mas isso é um risco da própria democracia 

Nos programas eleitorais,os partidos defendem, de uma forma geral, o aumento sustentado dos salários médios? Esse enquadramento é possível?

O salário médio não está dependente da decisão governamental, como está o salário mínimo. O salário mínimo pode ser aumentado como foi este ano, passou para 705 euros, e isso é uma decisão governamental, por despacho.

O salário médio está dependente do crescimento económico e por isso está bastante próximo do salário mínimo. Apesar da nossa economia estar alavancada nos fundos europeus, no turismo e em algumas actividades económicas, temos problemas que são estruturantes, designadamente a questão da produtividade. A baixa produtividade impede o crescimento da nossa economia e obviamente a questão da inovação.

Somos um país com algum reconhecimento na tendência inovadora, mas temos aqui alguns problemas ao nível da qualificação das pessoas, dos empresários, da qualidade de liderança e gestão, problemas de organização do trabalho. Temos ainda muita burocracia, ainda que se esteja a desburocratizar cada vez mais. Há aqui custos de contexto que são bastante caros às empresas, ao Estado e às pessoas. Tudo isto reduz muito o nosso potencial. 

A generalidade dos partidos compromete-se a desagravar a carga fiscal. A redução fiscal é a melhor solução para a economia do país?

A nossa carga fiscal é alta. Houve aqui um aumento da herança da Troika, mas é algo que não tem sido reduzido e isto não pode continuar, não temos uma economia que permita esta carga fiscal. Não seria nenhum problema se ganhássemos mais, mas não é isso que acontece.

Nesta questão da fiscalidade era preciso haver aqui uma espécie de pacto regime entre os principais partidos e que pudesse haver uma estabilidade fiscal, evitando a evasão fiscal, a elisão fiscal, havendo depois uma maior confiança no próprio regime.

A reforma da justiça e a luta contra a corrupção, que integram os programas eleitorais dos partidos, são urgentes para se acabar com a imagem de que existe hoje um clima de impunidade em Portugal?

Há mais um clima de tolerância relativamente a certos casos, mas essa tolerância tem sido reduzida. As pessoas já não são tão contemplativas com certas situações. Quando digo corrupção, penso que é a isso que se está a referir, é ao fenómeno da corrupção, um fenómeno mais lato, que não se reduz ao crime de corrupção.

O crime de corrupção é algo mais reduzido. Depois há outros fenómenos que estão associados e hCoutros crimes para além da corrupção, mas que pertencem ao fenómeno da corrupção. A fraude, por exemplo, é outra dimensão associada também à corrupção, apesar de em rigor não ser a mesma coisa.  

Em Portugal tem havido algum avanço no combate ao fenómeno da corrupção. Nós melhoramos um lugar no Índice da Percepção de Corrupção e consequentemente passámos da 33a posição para a 32a. Apesar de ainda estarmos abaixo da média da União Europeia, não deixa de ser uma tendência positiva.

Porém, o que tem faltado é uma vontade política séria, no sentido de ser uma prioridade na política de um governo. Essa vontade séria traduz-se na alocação de recursos para esse combate, nomeadamente para o Ministério Público, Polícia Judiciária e outros órgãos. Estes têm-se queixado continuamente que não têm meios. Não podemos esquecer que cada vez mais o fenómeno da corrupção é uma especialização e com meios altamente tecnológicos e é preciso um saber e uma tecnologia. É preciso que o Estado invista e isso não tem acontecido 

Sobre a regionalização, a maior parte dos partidos é favorável a uma descentralização. Descentralizar é a melhor resposta para o país? 

Descentralizar é algo fundamental para o país, há uma correlação positiva entre descentralização e desenvolvimento económico. A descentralização traz, entre outros benefícios, mais desenvolvimento e mais crescimento económico, mas Portugal ainda é um Estado bastante centralizado. 

A descentralização é positiva, fundamental para se dar o salto na questão da produtividade, competitividade, que se joga mais ao nível das regiões. Mas temos um factor histórico, somos um Estado unitário, homogéneo, com uma forte identidade e o problema da descentralização nunca se colocou. 

Por outro lado, precisamos que haja uma melhor gestão, mais próxima da população, com mais conhecimento da própria região e isso, chame-se regionalização ou não, vai ter de acontecer. A questão é sobretudo perceber se, a nível das finanças públicas, isto vai ter algum impacto.

A regionalização assusta muita gente porque as pessoas desconfiam que possa haver mais clientelismo partidário, ou um fenómeno maior de corrupção, de fraude, etc e isto tem de ser acautelado. É necessário não sobrecarregar o Estado central, as finanças públicas, os impostos, as pessoas, mostrando as mais valias da descentralização, até com casos internacionais.  

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