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2021 marcado pela pandemia e "extrema-direitização" da França

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França viveu 2021 ao compasso da pandemia de Covid-19, mas o ano também foi marcado pelo arranque do julgamento dos atentados de 13 de Novembro de 2015, pela expansão do movimento #MeToo, pela aprovação da Procriação Medicamente Assistida para todas as mulheres e pela divulgação de um relatório sobre a dimensão da pedofilia na Igreja Católica. O ano político foi marcado pelas eleições distritais e regionais e pela preparação do terreno para as presidenciais de 2022. 

Unidade de Cuidados Intensivos do Hospital Delafontaine de Saint-Denis, nos arredores de Paris. 29 de Dezembro de 2021.
Unidade de Cuidados Intensivos do Hospital Delafontaine de Saint-Denis, nos arredores de Paris. 29 de Dezembro de 2021. AFP - ALAIN JOCARD
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Para fazer um balanço sobre o ano de 2021 em França, convidámos Luísa Semedo, Doutora em Filosofia Política e Ética, que alerta que as agendas foram marcadas pela "extrema-direitização" da França.

18:08

Balanço do ano em França por Luísa Semedo

Restrições sanitárias, vacinação, teletrabalho, passe sanitário, recolher obrigatório, testes, Delta, Omicron foram palavras que passaram a fazer parte do dia-a-dia em França, como um pouco por todo o mundo. Ainda que não seja “completamente negativa ou muito crítica” relativamente à gestão da pandemia de covid-19 em França porque “é uma questão demasiado grave para haver algum tipo de quezílias”, Luísa Semedo lamenta a falta de apoio aos mais necessitados e a falta de solidariedade dos países mais ricos, nomeadamente a França, com o resto do mundo.

“É uma das matérias em que podemos criticar Emmanuel Macron. No início, tanto Emmanuel Macron como outros líderes ocidentais – se assim se pode dizer – tinham um discurso muito humanista e diziam que estava aqui uma nova era, um novo mundo que ia começar, que era evidente que estávamos todos no mesmo barco e que, portanto, iria haver, em relação às vacinas, partilha para todo o mundo. O que se viu rapidamente foi que não, que cada um se fechou no seu próprio interesse, na sua própria nação ou no seu próprio grupo um pouco mais estendido, neste caso a União Europeia, mas os países africanos e da América do Sul ficaram completamente para trás”, considera.

Outro tema a marcar o ano foi o arranque, em Setembro, do julgamento dos atentados de 13 de Novembro de 2015 em Paris e Saint-Denis, “um momento colectivo” para se “reflectir sobre o traumatismo e saber que é possível, numa sociedade democrática, fazer estes julgamentos, ou seja, tentar ultrapassar algo absolutamente horrível, através da lei”.

A aprovação da Procriação Medicamente Assistida para todas as mulheres foi também “um avanço muito importante” do ano em França. “A França, nestas matérias, apesar de uma imagem um bocado progressista no mundo, acaba por ser bastante conservadora. Demorou imenso tempo até termos o casamento para todos e eu vi nessas manifestações muita coisa que não se verificou noutros países como, por exemplo, em Portugal que é um país normalmente mais reservado e mais católico. Portanto, as forças reaccionárias nestas matérias têm bastante força em França (…) É um grande avanço, apesar de vir tarde e de se saber que, neste momento, há uma grande lista de espera porque demorou muito tempo e há imensas mulheres à espera.”

Para Luísa Semedo, a expansão do movimento #MeToo de denúncias de abusos sexuais “é uma evolução absolutamente essencial” porque “o medo está a mudar de campo” e “apesar de haver ainda muito por fazer, hoje é impossível não falar sobre essa matéria e fingir que isso não acontece”. “Não é por acaso que tantos casos vêm ao de cima porque a palavra das mulheres está-se a libertar e vai haver mais casos. Existe um terreno propício para que isso aconteça, para que as mulheres se sintam um bocadinho mais seguras para falar, um bocadinho mais seguras para que a sua palavra tenha crédito, apesar de, cada vez que uma mulher fala, ela ser atacada de uma maneira absolutamente selvagem”, aponta.

O ano político foi marcado pelas eleições distritais e regionais e a preparação do terreno para as presidenciais de 2022. Luísa Semedo não se espanta com a existência de duas candidaturas ao Eliseu de extrema-direita, Marine Le Pen e Eric Zemmour, tendo em conta “um movimento mais geral de ‘direitização’ de vários países”. A investigadora considera que Valérie Pécresse, da direita, é a adversária com mais peso para enfrentar eventualmente Emmanuel Macron e lamenta que a esquerda esteja “dividida” para enfrentar as presidenciais.

A falta de ajuda aos migrantes é, para Luísa Semedo, consequência da “extrema-direitização dos políticos” porque “a extrema-direita já condiciona as agendas e posicionamentos e alguns políticos - que podiam estar à esquerda ou no centro - acabam por seguir esta linha de repressão e da protecção a todo o custo das fronteiras”.

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