Tratamento de cancros na Ucrânia ensombrado por denúncias de corrupção

Kiev, Ucrânia – A guerra na Ucrânia arrasta consigo impactos em sectores da sociedade mais sensíveis. É o caso da Saúde e em particular na área oncológica onde muitos doentes viram os seus tratamentos interrompidos pela invasão russa. Para além disso, como nos conta o repórter José Pedro Frazão, há problemas antigos que persistem como a burocracia e a corrupção que também minam estes esforços.

[Ilustração, Hospital ucraniano em 2021]/ Na Ucrânia, a guerra e a corrupção atingem actividades como o tratamento de cancros. Este é o relato da líder da Fundação “Inspirational Family” em entrevista à RFI. REUTERS - STANISLAV KOZLIUK

A corrupção na Ucrânia também atinge actividades como o tratamento de cancros. Em entrevista à RFI, a líder da Fundação "Inspirational Family", que segue milhares de pacientes com cancro na Ucrânia, diz que há problemas na gestão de alguns centros hospitalares dedicados ao cancro.

"Em vários pontos do país, por exemplo, há doentes a pagar por medicamentos e por exames como as tomografias axiais computadorizadas sem terem que o fazer, uma vez que são legalmente cobertas pelo estado ucraniano", explica Anna Uzlova, presidente executiva desta organização que presta aconselhamento e apoio a famílias de pacientes oncológicos.

A corrupção é um problema antigo e a guerra veio apenas tornar algumas realidades mais visíveis. "Há também a emigração de médicos e sobretudo uma grande falta de enfermeiras", profissão que, diz Anna Uzlova, é demasiado desvalorizada pela sociedade ucraniana.

Em zonas próximas da chamada linha da frente, como em Kharkiv, alguns centros oncológicos foram também atingidos pela ofensiva russa, obrigando os doentes a fazerem tratamentos de quimioterapia em caves e subterrâneos até conseguirem fugir. O estrangeiro foi o destino mais frequente. A fundação liderada por Anna Uzlova encaminhou centenas de doentes oncológicos para centros congéneres nos Países Baixos, Reino Unido e outros países europeus.

Esta dirigente assinala que aumentaram também os pedidos de ajuda na área da saúde mental nestes pacientes que acumularam a sua condição com as perturbações de ansiedade e depressão presentes numa grande fatia da população devido à guerra.

Desde Fevereiro de 2022, o consumo de antidepressivos disparou. No mesmo período aumentou também o número de homens que procuram esta fundação. Os ucranianos do sexo masculino já podem sair do país por oncológicas, mas a burocracia nesse sentido continua a não ajudar.

Há carências nas imunoterapias e tratamentos inovadores na Ucrânia. Uma lei sobre este assunto tinha acabado de ser aprovada na Ucrânia quando começou a invasão de larga escala, o que fez congelar o processo, explica a líder desta organização.

Os números dos cancros na Ucrânia não estão actualizados devido à guerra e os mais recentes, de 2022, apresentam distorções por causa da instabilidade no país, sendo que nalgumas províncias ocupadas pela Rússia, não há informação fiável há alguns anos.

De acordo com os registos oficiais, o cancro da mama é o que apresenta maior incidência entre as mulheres dos 30 aos 54 anos. Representa 30% dos casos de cancro e mata 20% das mulheres ucranianas. A seguir vem o cancro da pele, que entre homens e mulheres, é o segundo com maior prevalência na Ucrânia.

Quanto ao cancro nas crianças, a maior parte delas foi para o estrangeiro nos dias seguintes à invasão de larga escala. Anna Uzlova reconhece que as organizações ligadas aos cancros pediátricos são mais poderosas e beneficiam do facto de ser mais fácil de angariar verbas para financiar ajuda às crianças e às suas famílias. Nas crianças e adolescentes, as leucemias dominam a lista dos cancros

Ouça aqui a correspondência de José Pedro Frazão, correspondente na Ucrânia.

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Correspondência da Ucrânia, 18/07/2023