Leonor Silveira, actriz portuguesa descoberta por Manoel de Oliveira, deu um salto na sua carreira, atravessou o Atlântico e foi filmar ao Brasil. O filme é "Todos os Mortos", na competição internacional do Festival de Cinema de Berlim. Rui Martins esteve com Leonor Silveira, em Berlim. Ela fala-nos da sua experiência no Brasil e mesmo das suas próximas filmagens em Portugal.
O filme "Todos os Mortos", dos brasileiros Caetano Gotardo e Marco Dutra, lembra uma época em que o Brasil, ainda bastante próximo de Portugal, tinha acabado com a escravatura dos descendentes dos negros levados de África, e proclamara a República.
A última cena do filme "Todos os Mortos", exibido na competição internacional do Festival de Cinema de Berlim, mostra uma dolorosa realidade: muita coisa mudou no Brasil, a escravatura terminou há mais de um século, porém a sociedade brasileira praticamente mantém a mesma estrutura social racista.
O momento de se mudar tudo, explicou um dos realizadores do filme, Caetano Gotardo, passou sem se ter concretizado.
Agora, a tendência vai na direcção de uma estratificação, lembrando de certa forma a África do Sul.
Com a agravante de uma polarização religiosa entre os evangélicos, consumindo um cristianismo modelado e exportado pelos americanos, e as crenças trazidas de África pelos escravos.
Síntese do filme
Dez anos depois de terminada a escravatura, a família Soares, três mulheres, sente-se perdida em São Paulo, após a morte de sua última empregada doméstica.
A família, que já possuía plantações de café, está agora à beira da ruína e luta para se adaptar. Ao mesmo tempo, a família Nascimento, que trabalhava como escrava na fazenda Soares, agora vê-se à deriva numa sociedade em que não há lugar para negros recentemente libertados.
As personagens do filme são a senhora idosa habituada a mandar na filha freira tentada por idéias blasfemas, a irmã pianista, cuja mente é habitada pelo passado sombrio de sua comunidade e uma ex-escrava cuja força de vontade a guia para para uma vida melhor.
No encontro com a imprensa, os realizadores do filmes explicaram a criação do filme, aproveitando para criticar a actual situação brasileira, onde o governo de extrema-direita ataca o cinema e os artistas, usando mesmo da censura.
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