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Vida em França

Diogo Pimentão "às avessas" em Rouen

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“Desenhar às avessas” é a tradução livre da exposição “Dessiner à Rebours” de Diogo Pimentão, que até dia 1 de Abril estará patente no FRAC, Fundo Regional de Arte Contemporânea Normandia Rouen.Uma exposição monográfica do artista português. A primeira de Diogo Pimentão em França. 40 obras, algumas inéditas. Mais desenhos. Círculos. Obras feitas com a ajuda dos filhos. Obras que pedem a ajuda do público. A percepção de como o desenho saiu do lado bidimensional para algo mais físico, mais interactivo, mais em relação com o corpo, com o vídeo e depois com a fotografia.Mas os grandes formatos de Diogo Pimentão não faltam. As folhas de papel trabalhadas a grafite, onde o perto e o longe brincam com os olhos de quem as vê. Intimista, minimalista e ambíguo. 15 anos de um percurso marcado pela exploração da porosidade das fronteiras entre o corpo e o espaço.Além da exposição, Diogo Pimentão estendeu o convite para duas performances a Inbal Ben Haim, artista circense e cordelista, e ao coreógrafo e bailarino Emmanuel Eggermont.

Diogo Pimentão
Diogo Pimentão DR
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RFI: De onde partiu o convite para esta exposição?

Diogo Pimentão: Partiu de um convite do FRAC. Foi uma construção, porque, muitas vezes, estas exposições nestas instituições são algo efémero, fazemos uma exposição e depois não voltamos. Aqui criou-se uma relação muito diferente, houve primeiro uma aquisição proposta para agentes exteriores ao FRAC, que foi aceite, depois foi-me pedido também uma performance neste espaço de exposição que fiz no ano passado. Entretanto foi-me proposta uma exposição monográfica.

Isso para mim é muito interessante. Esta ideia de construção em torno do trabalho do artista, seja ele qual for. É importante haver esta relação de diálogo, de construção e de ir um pouco mais longe do que apenas um apontamento. Dever-se-ia trabalhar mais assim.

De uma certa maneira é daí que vem [este convite]. Do contacto com a Véronique Souben, directora do centro de arte [FRAC], que acabou por ser esta construção um pouco mais complexa. Ela já conhecia o meu trabalho em França, já tinha visto algumas exposições.

Também há um momento na obra ou no trabalho que pede ‘um revisitar’. Para mim é importante por várias razões: olhar para o meu trabalho ver obras que estão em coleccionadores, que provavelmente já não ia voltar a ver. Pô-las em perspectiva em relação a minha obra presente e, obviamente, dar algumas luzes e pistas que se criarão de futuro.

Por outro lado, também para mostrar algumas dimensões do trabalho que muitas vezes é dispersa e mostrada em vários países e que acaba por nunca ser compreendida. Determinados movimentos do trabalho que acabam por ser mostrados fora e aqui são unidos, são todos unidos de uma certa forma.

Temos aqui peças relacionadas com uma espécie de intervenção onde público é convidado a desenhar, há peças mais esculturais, peças mais relacionadas com fotografia, temos um vídeo.

Juntar isto tudo é criar uma espécie de materialidade e compreensão do trabalho.

São 40 obras. Como se chega a esta selecção?

A selecção foi feita em parceria com a própria directora do FRAC que já tinha algumas afinidade com o trabalho que tinha visto e estava muito curiosa em conhecer outras peças. As primeiras reuniões foram feitas com propostas de possibilidades de desenho de exposição.

Tendo em conta as limitações do espaço poderíamos ter ido por muitos outros caminhos, esta era uma exposição que poderia ter sido outra exposição ou muitas outras. Aqui quisemos dar ênfase a questões do trabalho que pudessem vir acentuar questões mais relacionadas com o objecto, com a escultura. Como é que o desenho saiu do seu lado bidimensional para algo mais físico, mais interactivo, mais em relação com o corpo, com o vídeo e depois com a fotografia.

Há obras aqui que nunca foram vistas. Obras inéditas, menos conhecidas, inacabadas. Há de tudo um pouco, de um Diogo Pimentão menos conhecido.

A ideia é essa. Daí ser necessário um trabalho de construção. Se eu tivesse mostrado aqui apenas uma parte ou dimensão do trabalho, não iria ser completamente compreendido. Eu percebo bem e sei bem de onde ele vem e para onde vai.

Mas também é importante para si?

É muito importante para mim também. Importante ter a possibilidade de reunir estas obras e de reunir o pensamento. É uma forma de repensar o trabalho do artista e, de uma certa forma, mostrar aqueles pequenos interstícios, obras que nunca tinha mostrado e que, neste momento, fizeram sentido mostrar para veicular um pensamento, que não tinha visto quando tinha feito estas obras há 15 anos. Neste momento elas têm um lugar, um momento, um lugar de ser.

Como traduz para português ‘Dessiner à Rebours’? Desenhar às avessas, ao contrário, em contramão, em contraciclo? Qual das traduções lhe convém?

Todas elas! Na realidade são todas elas. Toda essa ambiguidade da transformação às avessas. Desenhar é um percurso que se faz de construção mas o artista sabe desenhar às avessas, criar espaços que não estejam representados no papel, que tenham outras dimensões.

Às avessas, desenhar para trás, de trás para a frente. Também nas questões do tempo. Pelo facto de ser uma monografia e de irmos buscar peças do passado.

Sobretudo pela aproximação que tenho ao desenho. Que não é uma relação directa. Não é um desenho com lápis na mão, sentado numa cadeira, com um plano de trabalho à frente. É tentar procurar que o desenho exista.

Gosto de pensar que o artista, muitas vezes, quer mesmo fazer este projecto a 80% mas por vezes ele está lá apenas a 20%, porque começa a ver que o resto da percentagem é a vida a acontecer.

Se estivermos atentos ao desenho que estamos a fazer, ao percurso que estamos a fazer começamos a pensar no que não estávamos a pensar. O desenho tem essa vitalidade de poder dar-me de novo uma realidade que não é imposta apenas por mim.

Ainda consigo ser surpreendido pelo próprio trabalho e conceber espaços abertos de construção e situações novas que em vez de tirar do projecto, gosto de incluir. Gosto de pensar que o artista está lá só 10%, 20%, muitas vezes estou a quase 90%, é verdade, mas muitas vezes também vejo as coisas acontecer.

Este edifício potencializa o seu trabalho, a fronteira entre aquilo que é a sua obra e o edifício em que ela se encontra?

Sim. Foi surpreendentemente positiva a relação, mais no primeiro encontrou, quando vim ver o edifício. Achei que havia demasiadas aberturas, um confronto estrutural bastante forte.

Com a exposição terminada acabo por ver que há uma espécie de osmose e comunicação. Estamos no andar de baixo e conseguimos ver instalações de peças no andar de cima. Há uma das peças que está no primeiro andar que toca quase no tecto, há outra aqui atrás de nós que parece que faz parte do edifício, parece uma coluna, mas é um desenho com 3m de altura.

Isso acaba por criar fragilidades e questionarmos a força do edifício, repensarmos a questão do cimento que é o que estrutura e sustém este edifício. Portanto há sim esse diálogo e no meu trabalho acho que isso é importante.

É uma espécie de medida do espaço, há um desenho que não pode existir apenas numa vitrina, tem que haver essa comunicação. Não é como a ‘Gioconda’ que poderá estar emoldurada e protegida de um público naquela vitrina que funciona e não mudará em qualquer outro espaço, no meu caso há essa comunicação entre o meu trabalho e o espaço específico. Daí, com certeza, a escolha de certas obras para esta exposição.

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