Retomada de projeto da Vale na Argentina é trunfo para negociações bilaterais
Os governos de Brasil e Argentina tentam convencer a companhia brasileira a rever a sua decisão de deixar o país. Para o governo brasileiro, o investimento é estratégico: os 6 bilhões de dólares da mineradora Vale do Rio Doce seriam uma moeda de troca para concessões argentinas em outras áreas.
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Márcio Resende, correspondente da RFI em Buenos Aires
Trata-se simplesmente do maior investimento na Argentina: exploração de potássio a fim de escoar a produção para o Brasil.
O megaprojeto na província de Mendoza, oeste da Argentina, envolvia a construção de uma ferrovia que atravessaria a Patagônia até um porto para embarcar a produção. No total, 6 bilhões de dólares que gerariam 6 mil empregos.
Em março, porém, depois de já ter investido 2 bilhões de dólares, a mineradora brasileira Vale anunciou a suspensão do projeto. O impacto na economia local e na política dos dois governos foi grande.
As autoridades preferem que a mineradora brasileira reveja a decisão. Agora, o governo argentino apresentou uma proposta à companhia brasileira.
"Nós escutamos a proposta, mas simplesmente escutamos. Não temos nenhum poder de decisão sobre a Vale, uma empresa privada. A proposta foi feita para a Vale e foi informada ao governo brasileiro", explicou o assessor para assuntos internacionais da Presidência, Marco Aurélio Garcia.
Ele voltou à Argentina para um seminário na Universidade Tres de Febrero, uma semana depois de ter estado com as presidentes Dilma Rousseff e Cristina Kirchner na Casa Rosada.
Garcia não deu detalhes sobre a proposta do governo argentino, mas a classificou como "boa" porque contorna vários problemas. Um deles tem a ver com a situação cambial na Argentina.
A Vale exportaria o potássio para o Brasil com o dólar oficial, mas os custos locais com uma inflação galopante estão próximos do dólar paralelo, 85% mais alto que o oficial. Quem paga essa diferença? A Vale não tinha conseguido vantagens fiscais do governo argentino e decidiu sair do país.
E enquanto as presidentes discutiam o assunto em Buenos Aires na semana passada, na mesma hora a Vale reafirmava a sua decisão de deixar a Argentina. A falta de tato da empresa caiu muito mal para os governos de Brasil e Argentina.
"Em primeiro lugar, estavam numa negociação. Não tinham dado por finda essa negociação. Em segundo lugar, se as duas presidentas estavam reunidas aqui, é um absurdo!", indignou-se Marco Aurélio Garcia.
Empresários brasileiros têm reclamado do clima de negócios na Argentina. São barreiras comerciais, controles cambiais, mudanças de regras e a proibição de realizarem remessas de lucros ao exterior.
"Esperamos que ainda se possa chegar a um acordo por uma razão muito simples: o projeto da Vale é de grande importância para a Argentina e de grande importância para o Brasil", disse Garcia.
Para o governo brasileiro, as negociações entre a Vale e o governo argentino entram numa estratégia de negociação global. O governo brasileiro quer usar os investimentos e o financiamento do BNDES para contornar o cerco argentino aos importados.
O Brasil tem perdido mercado no país devido às crescentes restrições argentinas às exportações brasileiras. As negociações entre os governos continuam daqui a 10 dias em São Paulo.
"Queremos uma negociação global. Queremos fazer um pacote porque como para nós é uma relação essencial na América do Sul. Argentina e Brasil são em grande medida fiadores do processo de integração da região", ponderou Marco Aurélio Garcia ao envolver nas negociações aspectos comerciais, econômicos e políticos.
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